25/11/2013 – Afrouxamento de regras para punir inadimplência de pensão alimentícia divide Câmara dos Deputados

25 de novembro, 2013

(Diário de Pernambuco) A tentativa de afrouxar as regras que punem com sentença de prisão em regime fechado pais e ex-maridos inadimplentes com a pensão alimentícia acirra os ânimos na Câmara dos Deputados, onde as bancadas masculina e feminina entram em conflito em torno das mudanças propostas no novo Código de Processo Civil. A maioria masculina na Casa incluiu o regime semiaberto para inadimplentes em relatório aprovado pela comissão especial que analisou o Código, além da prisão domiciliar, nos casos em que não há celas especiais disponíveis no sistema prisional, separadas dos presos de alta periculosidade. Diferentemente delas, os deputados trabalham em silêncio e evitam declarar o apoio público à mudança.

A polêmica segue sem consenso. “A cobrança da pensão alimentícia é um calvário”, assinala o advogado de direito de família Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família (Ibdfam). Contrário à mudança do texto, ele considera ser longo o tempo de espera até a execução da pensão alimentícia com as regras em vigor: uma ação leva em média cerca de seis meses, mas pode se estender por anos quando o inadimplente não paga e é necessário um novo processo judicial com pedido de penhora dos bens. “Apesar de haver a penhora eletrônica, esse é um processo muito demorado”, avalia o advogado. “Enquanto isso, os filhos passam necessidade e a mãe fica muito sobrecarregada.”

A juíza da 1ª Vara de Família, Órgãos e Sucessões de Sobradinho, no Distrito Federal, Ana Maria Louzada, defende a prisão semiaberta para casos em que o devedor comprove vínculo trabalhista. “Assim, ele não perde o emprego e à noite fica segregado”, considera a juíza, que tem adotado sistematicamente esse entendimento em suas decisões. “Quando determino o equivalente ao regime semiaberto, o réu tem de demonstrar que está empregado. Senão, decido pelo regime fechado.” Entretanto, suas determinações têm sido reformadas pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), que mantém a interpretação de regime fechado para todos os devedores, prevista hoje no código.

Para a juíza, se for aprovada a mudança do regime fechado para o semiaberto, conforme sugere o relatório aprovado na Câmara dos Deputados do novo Código de Processo Civil, as mulheres não ficarão prejudicadas. “Não é o fato de o regime ser fechado ou semiaberto que fará o devedor pagar. A simples decretação de prisão pelo juiz faz em 99% dos casos com que paguem ou façam proposta para que a dívida seja parcelada”, diz ela. “É impressionante como as coisas se resolvem com a decretação de prisão. O dinheiro, de repente, aparece”, observa Ana Maria Louzada.

Efetividade

Está aí um ponto, que é consensual entre especialistas. “A única coisa que realmente faz os devedores pagarem a pensão é o medo da prisão”, resume o advogado Rodrigo da Cunha Pereira. Entre as milhares de ações com pedido de pensão alimentícia nas varas de Família de Belo Horizonte e comarcas do estado, por exemplo, estima-se que apenas 1% chegue ao ponto da decretação da prisão.

Polêmica divide a Câmara

Para além de qualquer argumento em defesa da prisão semiaberta em substituição ao regime fechado, a bancada feminina na Câmara dos Deputados não está convencida. A coordenadora Jô Moraes (PCdoB-MG) assinala: “Em seu conjunto, o novo Código é um avanço e moderniza a atividade processual. Mas as alterações na questão alimentícia são perdas dos direitos conquistados das mulheres e crianças que não podemos aceitar”.

A proposta incluída no relatório que será apreciado em plenário prevê o regime semiaberto para todos os devedores de pensão alimentícia, e não apenas para aqueles que trabalham. Além disso, a proposta amplia de três para 10 dias o prazo para que o inadimplente pague a pensão. “Querem flexibilizar uma situação quando o que está em jogo é a sobrevivência das crianças que dependem dessa pensão”, afirma Jô Moraes. De acordo com o deputado Mário Heringer (PDT-MG), o semiaberto ajudaria a solucionar o problema. “O semiaberto dá a possibilidade que ele resolva o problema. O objetivo não é manter a pessoa presa, mas que pague”, pondera.

Em negociação com o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), relator do novo Código de Processo Civil, a bancada feminina chegou a um acordo: serão apresentadas emendas que mantêm o regime de prisão fechada e o prazo máximo de três dias de atraso. Em contrapartida, as deputadas sustentarão a proposta de estabelecer as celas especiais para os presos nessas condições. Teixeira concordou com a ponderação, mas enfrentou resistência dos demais parlamentares da comissão especial, com os quais havia negociado o texto anterior. (BM)

O que está em jogo: Entenda o que se discute em torno das pensões alimentícias no novo Código do Processo Civil

Prazo – Os pais têm hoje três dias para o pagamento da pensão atrasada. A proposta aumenta o prazo para 10 dias.

Regime de prisão – Atualmente, ocorre em regime fechado. No relatório aprovado pela comissão especial, os deputados concordaram em deixar o pai preso em regime semiaberto nos primeiros três meses. Se for reincidente, vai para o regime fechado.

Celas – Os pais que não pagam a pensão podem hoje ficar presos com criminosos comuns, embora, na prática, existam celas separadas para esses casos. Pela nova proposta, eles deverão ser levados para celas separadas. Caso o sistema prisional não as disponibilize, ficarão em prisão domiciliar.

Acesse o PDF: Lobby masculino no pagamento de pensão (Diário de Pernambuco, 25/11/2013)

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