25/03/2013 – Editorial: Na própria casa

25 de março, 2013

(Folha de S.Paulo) O Senado deve votar nesta semana, de forma definitiva, a proposta de emenda constitucional que estabelece a igualdade de direitos trabalhistas entre os empregados domésticos e os demais funcionários urbanos e rurais do país.

Trata-se de avanço formidável em relação ao atual texto da Constituição. Embora reconhecida pela ampliação dos direitos sociais, a Carta de 1988 não foi até o ponto de pôr fim às relações anacrônicas de trabalho que se observam em boa parte dos lares brasileiros.

É difícil deixar de reconhecer características coloniais no vínculo entre patrões, de um lado, e, do outro, aqueles que prestam serviços domésticos, como motoristas, jardineiros, babás e cozinheiros.

Não é apenas na cor da pele e na subalternidade social da maioria desses empregados que se vislumbra o resquício da escravidão abolida. Tal herança, vestigial na experiência cotidiana, insinuou-se inclusive no arcabouço jurídico.

O artigo 7º da Constituição, ao prescrever 34 garantias aos trabalhadores urbanos e rurais, ressalva, no parágrafo único, que os funcionários domésticos têm assegurados somente nove daqueles direitos, além da integração à previdência social.

Desse rol restrito ficaram de fora prerrogativas básicas, como pagamento de horas extras; jornada limitada a oito horas diárias e 44 horas semanais; recolhimento do FGTS; proteção contra demissão sem justa causa; adicional noturno; seguro contra acidentes de trabalho; auxílio-creche.

Essas garantias, entre outras, agora alcançarão todos os trabalhadores. Como se vê, nem é justo dizer que a chamada PEC das Domésticas “amplia” os direitos dessa categoria profissional, embora esse seja o resultado prático da emenda. É mais apropriado afirmar que a iniciativa elimina a distorção trabalhista que existe.

Se aprovadas no Senado, como se espera, as novas regras entrarão em vigor tão logo sejam publicadas no “Diário Oficial” (não vão a sanção presidencial). Alguns pontos, como o FGTS, precisarão ser regulamentados. Outros, como as horas extras, valerão imediatamente.

A novidade decerto onerará setores da classe média, pois elevará o custo do funcionário doméstico -cujo trabalho já se valorizou acima da média nos últimos anos. É possível até que o preço se torne impeditivo para muitos.

Não há o que fazer contra essa tendência. Foi a trilha percorrida pela maioria dos países desenvolvidos. Não será diferente no Brasil que se desenvolve e se moderniza, não tanto deixando para trás o trabalho doméstico, que seguirá existindo, mas dando reconhecimento pleno e digno a seu valor.

Acesse o pdf: Na própria casa (Folha de S.Paulo – 25/03/2013) 

 

 

 

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