FMI calcula que PIB global cresceria ao menos 4% se o trabalho não remunerado fosse mais bem distribuído
(El País, 17/10/2019 – acesse no site de origem)
O que é mais privado do que a organização de cada família sobre quem faz a cama, prepara o café da manhã ou leva as crianças para a escola? À primeira vista, parece um assunto que não deveria importar para ninguém de fora da casa. Mas se analisarmos um pouco mais, essas decisões são relevantes do ponto de vista econômico. Porque uma melhor distribuição dessas tarefas, que em geral recaem principalmente sobre as mulheres, serviria como um estímulo para impulsionar o crescimento global. Esta é a principal conclusão de um artigo apresentado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) na assembleia anual que realiza esta semana em Washington.
“O trabalho não remunerado é uma parte substancial da atividade econômica que não se reflete no PIB e pesa desproporcionalmente sobre as mulheres”, diz um texto que considera muito importante “reduzir e redistribuir” essa carga.
O Fundo estima que no mundo as mulheres façam duas horas de trabalho não remunerado todos os dias mais do que os homens. E, embora essa diferença seja menor nos países mais ricos, que podem se permitir o que o artigo chama de “motores de libertação”, esta continua existindo também onde as mulheres desfrutam de maior independência. “Mesmo nos países mais igualitários do mundo, as mulheres fazem pelo menos 20% mais de trabalho não remunerado”, afirmam os economistas que assinam o texto.
Além de outras considerações, o artigo critica essa carga de trabalho desproporcional por gerar uma menor participação da mulher no mercado de trabalho e uma diminuição geral da produtividade. E estima que, se fossem implementadas políticas para reduzir essas diferenças, o PIB global aumentaria ao menos 4%, de acordo com um cálculo que os próprios autores consideram conservador.
O artigo admite que grande parte desse trabalho é feita por escolha pessoal. Mas também lembram que “com muita frequência” as mulheres são forçadas a fazê-lo. “O tempo que dedicam a essas tarefas reflete as restrições impostas pelas normas culturais e a falta de serviços públicos, infraestrutura e políticas de licenças familiares”, continua.
Já faz anos que o FMI quer mostrar um rosto mais amigável e concentrar sua atenção em questões como inclusão financeira no terceiro mundo ou igualdade de gênero. Esta é a primeira vez que o organismo tem mulheres como diretora-gerente –Kristalina Georgieva, que sucedeu Christine Lagarde– e como economista-chefe –Gita Gopinath. “Apertem o cinto! [A igualdade de gênero] vai chegar”, disse Georgieva na terça-feira em um evento no qual falou sobre o papel das mulheres no organismo, em que apenas 25% dos postos mais altos são ocupados por mulheres. E insistiu que os estudos mostram que a igualdade promove o crescimento econômico.
O artigo não se limita a apontar um problema. Também sugere um caminho para aliviá-lo. Propõe aos Governos dos países em desenvolvimento investirem em infraestrutura, segurança e serviços como água ou eletricidade, para descarregar as mulheres de trabalho. E sugere a todos os países do mundo melhorar a conectividade digital. É outra maneira de promover uma maior participação da mulher no mercado de trabalho formal. Aquele que é computado nas estatísticas.
Por Luis Doncel