(Folha de São Paulo | 09/05/2021 |Por Marina Dias)
O impacto da pandemia na vida das mulheres tem ganhado um novo e doloroso capítulo com a retomada econômica. Ainda mais sobrecarregadas, elas estão abandonando o mercado de trabalho, apesar da reabertura ou criação de vagas de emprego em diversos lugares do mundo.
Em entrevista à Folha, a diretora-executiva-adjunta da ONU Mulheres, a indiana Anita Bhatia, faz uma análise sombria das consequências que a crise sobre as trabalhadoras pode ter até para a recuperação econômica dos países em desenvolvimento.
“A carga de cuidados das mulheres é muito pesada —e elas já faziam três vezes mais do que os homens antes da pandemia. Agora, com crianças em casa, ensino remoto e outros encargos, mulheres têm abandonado o mercado de trabalho”, afirma. “E isso terá consequências de longo prazo nas suas rendas, vidas, perspectivas de carreira e, finalmente, terá impacto nos países, porque, se um número significativo da população não pode voltar a trabalhar por causa da carga de cuidados, isso é um problema real.”
Segundo dados da ONU, só na América Latina o número de mulheres fora do mercado de trabalho saltou de 66 milhões para 83 milhões com a pandemia, que atingiu com mais potência setores em que a força é predominantemente feminina, como varejo, turismo e trabalhos domésticos.
Além de mais violência, menos emprego e menos acesso à saúde, diz Bhatia, as mulheres têm sofrido com a segregação de gênero em relação a novos postos que surgiram no último ano. Muitas delas não têm acesso a ferramentas para o trabalho remoto e têm sido ainda mais marginalizadas.
Na avaliação da executiva da ONU, a reintegração das mulheres ao mercado de trabalho vai acontecer apenas onde tiver vacinação ampla e medidas de governos e empresas para facilitar esse retorno. “Se não houver reconhecimento do vínculo entre a carga de cuidado e a capacidade da mulher de trabalhar fora de casa, não será possível mudar a vida delas.”