Em meio a uma das corridas eleitorais de cenário mais incerto dos últimos anos, um tema tem sido recorrente: igualdade salarial entre homens e mulheres. Alguns candidatos, com Jair Bolsonaro (líder das intenções de voto em um cenário sem Lula) e João Amoêdo, do NOVO, já declararam, respectivamente, que a maternidade é uma razão aceitável para a desigualdade salarial e que o Estado não deve interferir nesse assunto. Outros candidatos (especialmente Marina Silva, a única mulher no pleito) fizeram do tema motivo para embate e para demonstrar sua visão contrária.
Muito legal, não fosse o fato de estarmos no ano de 2018.
(Emais, 30/08/2018 – acesse no site de origem)
Enquanto a NASA descobre depósitos de gelo na Lua e moléculas orgânicas em Marte, um dos maiores países da Terra ainda está discutindo, literalmente, se homens e mulheres devem ganhar o mesmo salário. Não é como devem ganhar, é SE devem. Somos nós precisando reafirmar que merecemos sim ganhar a mesma coisa e que garantir a igualdade é uma responsabilidade do Estado. Uma luta dos séculos XIX e XX que parece não ter se encerrado por aqui.
Não é que o tema não mereça debate. Merece e muito, porque a desigualdade salarial se apresenta de maneiras muito sutis no mercado de trabalho. Isso pode e deve ser discutido, repensado, colocado sob os holofotes. É uma pauta essencial para a igualdade entre homens e mulheres de maneira geral, não apenas economicamente falando. O problema é que a discussão ainda não superou sequer o pressuposto de que devemos combater a desigualdade.
O fato de ser esta a principal pauta feminina em debate na corrida pelo Planalto simboliza o que foram os últimos quatro anos para os direitos das mulheres: derrota atrás de derrota, com raríssimos momentos a ser comemorados. Um verdadeiro 7×1. Em 2010 e 2014, o tema “feminino” que dominou a arena pública foi o aborto. Outra discussão que já poderia ter sido superada, mas que encontra eco em vários outros países do mundo, inclusive da América Latina, que também debatiam e debatem o tema ao mesmo tempo. No contexto brasileiro, ver presidenciáveis perguntarem (ainda que retoricamente) se homens e mulheres devem receber o mesmo salário ao exercer as mesmas funções não pode ser chamado de outra coisa que não retrocesso.
Há muita coisa em jogo para as mulheres brasileiras. E os candidatos sabem bem disso, porque é de conhecimento público que somos nós o maior grupo entre os eleitores indecisos. Provavelmente serão as mulheres, seus votos e rejeições, que vão decidir quem vai ganhar a corrida presidencial. Esse é um motivo explícito para abordar pautas “femininas” em debates e programas de governo, mas não se deve ignorar o crescimento do debate feminista nesse intervalo, hoje muito mais presente no cotidiano e cobrado de políticos, celebridades e servidores públicos.
Pode ser que saia vencedor algum candidato veementemente contra a desigualdade salarial. Pode ser que não. Faz parte da democracia. O que acho é que independentemente do resultado já perdemos, ou não estaríamos sequer nesse nível de debate.