Documento elaborado pelo Ministério do Desenvolvimento mostra que 75% da categoria não tem carteira assinada
Sete em cada dez trabalhadoras domésticas remuneradas se sentem cronicamente cansadas, sem tempo para descansar ou atender às próprias necessidades biológicas, como o sono. Tal sobrecarga se agrava com a ausência de direitos, baixa renda, longos tempos de deslocamento, pressão para sustentar o lar e culpa por não conseguir se dedicar aos filhos.
Isso afeta principalmente as mães chefes de família, que representam 57% da categoria, sendo 34% mães solo. Essa proporção é ainda maior entre as trabalhadoras negras (80%) do que entre as brancas (75%).
É o que mostra o estudo inédito “As trabalhadoras domésticas remuneradas são trabalhadoras do cuidado: Elas têm o direito a cuidar, a ser cuidadas e ao autocuidado”, realizado pela Secretaria Nacional da Política de Cuidados e Família do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome em parceria com a FITH (Federação Internacional das Trabalhadoras Domésticas) e a OIT (Organização Internacional do Trabalho).
A pesquisa com 665 trabalhadoras de todo o país mostra como jornadas exaustivas, baixos salários e insuficiência de serviços públicos limitam a capacidade dessas profissionais de cuidar, serem cuidadas e praticarem o autocuidado.
“As pessoas não dignificam o trabalho porque nos chamam para fazer um serviço e terminamos fazendo dez ao mesmo tempo: tomando conta da casa, dos filhos, dos avós que estão acamados. Tudo para receber apenas um salário mínimo”, diz Djane Clemente, 58, que é trabalhadora doméstica há dez anos e mora na região metropolitana do Recife.
O tempo de deslocamento também consome sua rotina. Djane passou sete anos pegando quatro ônibus e dois metrôs para trabalhar —saía 15h e chegava às 19h, sempre em pé. “Quando chegava em casa, no final da noite, eu não ia nem na padaria. É como se desligasse a energia”, diz.
As trabalhadoras domésticas são a principal categoria da força de trabalho remunerada de cuidados no Brasil, representando 25% do setor e somando quase 6 milhões de pessoas. Exercem tanto o cuidado direto —que envolve relação direta com crianças, idosos e pessoas com deficiência— quanto o indireto, como limpeza, cozinha e administração da casa, atividades fundamentais para o bem-estar e funcionamento da economia.
Apesar da importância, o cenário é de precarização. Três em cada quatro trabalhadoras domésticas não têm vínculo formal, sendo a proporção de trabalhadoras negras com carteira assinada, 24,7%, menor que a de brancas, 31%. A desigualdade se agrava regionalmente: menos de 15% das domésticas negras do Norte e Nordeste têm carteira assinada.
“Se tivéssemos uma fiscalização fazendo valer o horário em que a gente entra e sai, adicional noturno pra quem precisar, hora extra pra quem possa fazer, a trabalhadora doméstica não adoecia tanto e nem envelhecia tanto”, afirma Djane.
Quase dois terços, ou 65%, das trabalhadoras domésticas recebem menos que um salário mínimo. A proporção é maior nas regiões Nordeste (88%) e Norte (83%), e menor no Sul (51%) e Sudeste (55%).