(O Globo, 08/05/2015) Presidente pretende vetar alíquota de 3,2% do FGTS e contribuição menor dos patrões para INSS
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A presidente Dilma Rousseff deverá vetar a contribuição mensal de 3,2% imposta aos empregadores como antecipação da multa de 40% do FGTS, paga em caso de demissão sem justa causa do empregado doméstico. Essa contribuição adicional — além dos 8% — foi incluída no projeto de regulamentação dos novos direitos da categoria, aprovado na quarta-feira pelo Senado. Segundo fontes do governo, o entendimento da Advocacia-Geral da União (AGU) é que a cobrança fere o princípio da multa, que é desestimular as demissões. O texto aprovado pelo Congresso foi encaminhado à sanção presidencial.
— O FGTS e a multa existem para proteger o trabalhador. Com a criação dessa poupança com a contribuição extra de 3,2%, o empregador não precisará pensar duas vezes antes de demitir — explicou um interlocutor do Planalto.
Segundo essa fonte, com esse item do projeto vetado, prevalecerá o pagamento da multa dos 40% de uma só vez, no ato das demissões sem justa causa, conforme ocorre com a maioria dos trabalhadores. O governo também avalia a possibilidade de vetar a redução da alíquota de contribuição dos patrões para a Previdência Social, de 12% para 8%, diante da perda na arrecadação, estimada em R$ 700 milhões por ano.
— O governo já expressou a posição contrária e estamos estudando juridicamente a possibilidade do veto — reforçou a fonte.
Segundo a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), que relatou o texto na Câmara, alterado no Senado, a CUT e outras centrais sindicais vão pedir à presidente para vetar a contribuição de 3,2%. Ela destacou que a PEC das domésticas, promulgada em abril de 2013, assegura a equiparação de direitos:
— A PEC manda igualar direitos e, por isso, não podemos criar uma legislação específica. Temos que aplicar o que está na CLT.
Para Luís Eduardo Afonso, professor do Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA/USP, a redução da alíquota de contribuição do INSS não vai prejudicar o trabalhador no futuro, porque o parâmetro para definir o valor da aposentadoria não é a alíquota e, sim, o salário sobre o qual ela incide.
— A redução da alíquota não implica prejuízo para o trabalhador. O que há é uma redução na arrecadação do governo, o que aumentará o déficit do INSS — afirma Afonso.
DEVERES DESIGUAIS
Já na contribuição de 3,2% a título de antecipação de multa rescisória, os especialistas veem brecha para questionamentos.
— A Constituição assegura o FGTS e a multa na demissão sem justa causa. Isto o empregado doméstico vai ter, da mesma forma que tem qualquer outro trabalhador. O problema é para o empregador doméstico, que terá uma obrigação que os empregadores não têm. Os direitos do empregado estão equiparados. O que não está equiparado são os deveres dos empregadores — diz Maria Luisa Soter, sócia da área trabalhista do Veirano Advogados.
— A PEC se propõe a igualar todo mundo, mas a lei cria mecanismos de diferenciação (como a contribuição de 3,2%). Isso pode dar base a argumentações contrárias à lei — diz a especialista em direito do trabalho Claudia Brum Mothé.
Apesar dos possíveis questionamentos, o idealizador da ONG Doméstica Legal, Mario Avelino, acredita que a criação dessa espécie de fundo de reserva para demissões a partir da contribuição de 3,2% é fundamental para que a lei se viabilize.
— Essa contribuição, acompanhada da redução da alíquota do INSS do empregador, é o que torna a lei exequível. Ela evita que se demita agora (por receio de um encargo futuro) e permitirá que a grande massa de trabalhadores na ilegalidade entre no mercado formal — afirma Avelino.
As mudanças nas regras acontecem num momento em que o número de domésticas do país voltou a crescer, após anos de queda. É um movimento causado por pessoas como Cintia Agripina de Carvalho, de 37 anos. Depois de trabalhar como doméstica desde os 17 anos, entre 2013 e 2014 ela conseguiu emprego como caixa de uma grande rede varejista e auxiliar de serviços gerais em um curso de inglês. Em janeiro, foi demitida e decidiu retornar para a antiga função.
— Pensei que fosse ser difícil essa volta, mas é uma rotina normal, de manter a casa em ordem. O importante é estar trabalhando — afirma Cintia, que ainda sonha com um trabalho mais qualificado.
Os novos direitos dos domésticos, como FGTS, salário-família, seguro-desemprego e adicional noturno entram em vigor em 120 dias, a partir da publicação da lei sancionada pela presidente. Os empregadores poderão recolher os encargos de forma simplificada, acessando o site E-Social (www.esocial.gov.br) — que está funcionando de forma experimental desde junho de 2013 — para a inscrição do trabalhador doméstico na Previdência Social e emissão da guia de pagamento. A inclusão do FGTS ainda depende de ajustes no sistema.
Geralda Doca, Danielle Nogueira e Clarice Spitz
Acesse o PDF: Lei para domésticas deve mudar com vetos do governo (O Globo, 08/05/2015)