(Valor Econômico, 22/03/2016) A taxa de homicídios entre a população negra e a de mulheres cresceu no país em um período entre 2004 e 2014. Os dados constam da pesquisa Atlas da Violência, apresentada na manhã desta terça-feira pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Somente entre afrodescendentes no Brasil, a taxa cresceu 18,2% entre 2004 e 2014 – sendo que, no mesmo período, caiu 14,6% a taxa de homicídios da população não preta ou parda. A pesquisa mostra que a taxa de homicídios entre a população negra subiu de 31,7 para 37,5 por 100 mil habitantes no período – enquanto que a taxa observada na população sem origem afrodescendente caiu de 18,3 para 15,6, em 10 anos até 2014.
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Negros são os mais visados pela polícia
Em apresentação da pesquisa esta manhã na representação do Ipea no Rio de Janeiro, o técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea, Daniel Cerqueira, ressaltou o crescimento das mortes violentas entre a população negra. “Não é coincidência o fato de que os Estados onde encontramos maior número de taxa de crescimento de homicídios [entre 2004 e 2014] são os que apresentam maior presença de população afrodescendente”, afirmou.
O pesquisador foi taxativo ao considerar o racismo como um dos fatores principais para o cenário. O técnico comentou que os negros são os mais visados em ações policiais. Ao mesmo tempo, os afrodescendentes também são presença majoritária em localidades de baixa renda com menor presença de forças de segurança e maior número de ações de violência.
Sem Maria da Penha seria pior
O levantamento mostrou ainda que a taxa de homicídios entre mulheres subiu 11,6% entre 2004 e 2014, de 4,2 para 4,6 a cada 100 mil habitantes. Para Olaya Hanashiro, Coordenadora de Projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, isso demonstra dificuldades da força de segurança pública em mitigar o problema.
Por sua vez, o pesquisador do Ipea comentou que os dados poderiam ser ainda piores, não fosse a legislação já elaborada sobre o tema para proteger as mulheres. “Creio que seria muito pior se não tivéssemos a lei Maria da Penha”, disse, acrescentando que, em sua avaliação, é necessário melhorar ainda mais a política pública voltada para o combate à violência contra a mulher no Brasil.
Jovens
A taxa de homicídios para cada grupo de 100 mil jovens entre 15 e 29 anos subiu de 52,7 para 61 entre 2004 e 2014 – o que representou um aumento de 15,6%. Com o aumento, a taxa de homicídio entre a população mais jovem no país é o dobro da média nacional.
A mesma pesquisa mostra que a taxa de homicídios, para todas as faixas etárias, cresceu de 26,5 para 29,1 no mesmo período – um aumento de 10%. Ou seja, o ritmo de expansão da taxa de homicídios entre os mais jovens foi mais elevado do que a média nacional, alertou Daniel Cerqueira.
“Temos hoje a maior geração de jovens do país, em torno de 51 milhões, e não estamos oferecendo oportunidades adequadas a esta geração”, afirmou. “É uma geração perdida”. Na análise dele, o maior envolvimento de jovens em ações violentas envolvendo crimes, principalmente tráfico de drogas, pode ser uma das razões para o atual cenário.
Outro aspecto mencionado por Olaya Hanashiro foi a grande presença de jovens em zonas mais pobres e sem acesso a recursos básicos, e com poucas oportunidades de educação, sendo mais suscetíveis ao aliciamento para ações violentas. “Há uma estigmatização de jovens negros de periferia que ajuda a empurrá-los para uma situação marginal”, disse.
Alessandra Saraiva
Acesse o PDF: Cresce a taxa de homicídios entre mulheres e negros (Valor Econômico, 22/03/2016)