Segundo relatório da ONU, a população trans e travesti se encontra em extrema vulnerabilidade no Brasil. A transfobia no país resulta em desigualdades sociais e problemas estruturais, como altos índices de evasão escolar, dificuldades de acesso ao mercado de trabalho e aos serviços de saúde, exclusão familiar e números alarmantes de violência, que levam, muitas vezes, a casos de homicídio e suicídio dessa população. Aqui, vale pontuar que marcadores raciais e territoriais são muito importantes quando discutimos a violência contra corpos trans, entendendo que pessoas trans negras e indígenas, principalmente de territórios já marginalizados, tendem a sofrer ainda mais com tais desigualdades.
Um fato já posto à mesa e reafirmado pelo doutor em Ciências Sociais da Unicamp Reinaldo Dias é que a emergência climática não apenas agrava condições meteorológicas e ambientais, mas também amplifica desigualdades sociais preexistentes, impactando desproporcionalmente as populações mais vulneráveis. Neste ponto, já temos dados e informações o suficiente para entender o que pessoas trans têm a ver com isso: a população trans e travesti é impactada de forma desigual pelos eventos climáticos extremos.
As enchentes no Rio Grande do Sul em 2024 ilustraram perfeitamente o que acontece com nossa população quando em vulnerabilidade: falta de assistência, negação de direitos, desumanidade; somos expulsos de abrigos, não conseguimos acessar serviços de saúde, sofremos violência sexual na rua e dentro de abrigos, passamos fome e somos agredidos fisico e verbalmente.
Se nem em circunstâncias de calamidade pública e ajuda humanitária somos lidos como humanos o suficiente, então a vida não nos atravessa da mesma forma, e a crise socioambiental que vivemos não carrega os mesmos significados.
Além disso, é importante pontuar que somos o principal alvo, atualmente, da necropolítica mundial e, assim, também somos excluídos do pensar-político em espaços de tomada de decisão internacionais, como a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.
Qual a importância disso?
Acordos internacionais são uma porta de entrada muito relevante para a construção de políticas domésticas e, para além, a obrigatoriedade de cumprimento desses acordos pode garantir a concretização de políticas públicas a nível nacional. Isso significa que incluir a população LGBTQIA+ e, principalmente, a população trans nos acordos e políticas climáticas deveria ser assunto inegociável na agenda de gênero do Brasil.
Por parte da sociedade civil brasileira, houve uma movimentação muito importante ao se mencionar mulheres e meninas trans, junto a outras mulheres LGBTQIA+, na nova submissão, assinada por 51 organizações, para fortalecer a estruturação do Plano de Ação de Gênero – legado importante que se espera da COP30, que acontecerá este ano em Belém. Além disso, a menção ao termo “transfobia ambiental” – que descreve as injustiças sociais e ambientais que recaem de forma desigual sobre pessoas trans e travestis – é um passo valioso na constante disputa de linguagem em que nos encontramos internacionalmente, onde a agenda antigênero tem ganhado espaço.
Apesar disso, ainda caminhamos a passos lentos. Poucas políticas climáticas nacionais e acordos internacionais, de fato, incluem a população trans. E, quando falo de população trans, estou me referindo à sua totalidade: transfeminilidades, transmasculinidades e não binariedades. Aqui, deixo a pessoalidade escrever por mim:
Agora que entendemos a importância de incluir mulheres trans e travestis na agenda de gênero, precisamos também entender quais cadeiras as transmasculinidades e não binariedades precisam ocupar.