Concurso do TRE de SP exige exame Papanicolau de candidatas

22 de setembro, 2016

Segundo órgão, pedido visa ‘averiguar aptidão ao trabalho’ no cargo público. Para professor de direito, exigência é ‘inconstitucional’ e ‘viola intimidade’.

(G1, 22/09/2016 – acesse no site de origem)

O edital de um concurso do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo (TRE-SP) exige que as candidatas apresentem um laudo do exame de Papanicolau (colpocitopatologia oncótica) como um dos requisitos de aprovação ao cargo. Veja o edital

O exame serve para identificar câncer do colo de útero, HPV e outras DSTs (doenças sexualmente transmissíveis). Por ser invasivo, o teste só pode ser feito por mulheres com vida sexual ativa.

O edital diz que “somente serão empossados os candidatos considerados aptos em inspeção de saúde de caráter eliminatório”.

O concurso também exige que as candidatas com mais de 50 anos apresentem o resultado de mamografia. Para homens, o edital pede um exame de sangue que detecta a presença de câncer de próstata.

Segundo a assessoria de imprensa do TRE-SP informou ao G1, os exames admissionais realizados pelo órgão implicam, “além da avaliação de saúde do candidato no sentido de averiguar aptidão ao trabalho”, também “no aspecto preventivo em todos os seus níveis”.

O professor de Direito Constitucional da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro) Fernando Bentes afirma que não há problema em exigir boa saúde física dos candidatos em concursos, mas considera que pedir exames invasivos como o Papanicolau é “uma grave violação da intimidade da mulher”. Segundo ele, trata-se de uma exigência “inconstitucional”.

Contudo, ele pondera que o concurso do TRE não faz discriminação por gêneros (entre homens e mulheres), já que exige dos candidatos do sexo masculino o exame de próstata. Qualquer exceção ao princípio da igualdade entre os candidatos precisa estar prevista em lei no edital, explica Bentes.

Fim do ‘teste de virgindade’
Em casos recentes envolvendo outros concursos no estado de São Paulo que também pediram o Papanicolau, a candidata precisava apresentar um “atestado” de um médico comprovando que seu hímen não foi rompido (o chamado “teste de virgindade”), caso não pudesse fazer o exame. Em 2014, a Defensoria Pública do estado tentou barrar o exame e essa obrigatoriedade.

A exigência do Papanicolau não caiu. Mas uma nova orientação do Conselho Regional de Medicina (CRM) passou a desobrigar as candidatas de justificar o motivo para pedir dispensa do teste, segundo a defensora e coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, Yasmin Mercadante Pestana.

“Recebíamos muitas denúncias contra a exigência desse atestado. Agora não é mais preciso justificar o motivo para não fazer o exame. Mas muitas candidatas não sabem disso”, explica. A defensora conta ter sido procurada por ao menos duas candidatas do concurso do TRE-SP, que está com inscrições abertas, em busca de esclarecimentos.

Segundo Yasmin, a orientação é que a candidata apresente um relatório de seu médico de confiança, sob sigilo, atestando que o exame não poderá ser feito.

Edital de concurso do TRE-SP exige Papanicolau de mulheres em fase eliminatória (Foto: Reprodução/Edital TRE-SP)

Edital de concurso do TRE-SP exige Papanicolau de mulheres em fase eliminatória (Foto: Reprodução/Edital TRE-SP)

Violação da intimidade
Segundo a Secretaria de Planejamento e Gestão Pública de São Paulo essa exigência cumpre o artigo 47, inciso VI, da Lei 10.261/68 (Estatuto dos Funcionário Públicos Civis do Estado de São Paulo), que dispõe entre outros requisitos “que o candidato goze de boa saúde, comprovada em inspeção realizada em órgão médico oficial”, informou ao G1.

“Para contratação de candidatos aprovados em concursos públicos, o Governo do Estado de São Paulo solicita uma série de exames capazes de detectar as doenças mais comuns. Além do Papanicolau, são pedidos também a mamografia, hemograma, eletrocardiograma, próstata, endocrinológico, entre outros”, diz o órgão por nota.

DF volta atrás em exigência
Em julho, o governo do Distrito Federal retirou a exigência de exames ginecológicos invasivos para as candidatas aprovadas no concurso do Corpo de Bombeiros. O edital causou polêmica porque previa a apresentação de laudo do Papanicolau.

Reprodução papanicolau (Foto: Reprodução)

Imagem simula exame de Papanicolau (Foto: Reprodução)

As regras do concurso também previam que candidatas virgens teriam de comprovar que não tiveram o hímen rompido.

Barrada por obesidade
Uma professora de Bariri (SP), aprovada em um concurso da Secretaria Estadual de Educação, foi impedida de dar aulas por estar acima do peso.

Ela passou em 35º lugar em 2014, mas foi reprovada na perícia médica por estar com o Índice de Massa Corporal (IMC) acima de 40, o que é considerado obesidade mórbida. O critério não estava especificado no edital, constava apenas que os candidatos deveriam gozar de boa saúde.

Ela conseguiu uma decisão favorável em primeira instância. A decisão cabe recurso e a Procuradoria Geral do Estado informou que está analisando a sentença e poderá recorrer da decisão judicial.

Concurso do TRE-SP
O órgão abriu concurso público para 14 vagas e cadastro de reserva em cargos de nível médio e superior. Os salários são de R$ 5.934,15 e R$ 9.736,27, respectivamente.

Os cargos de nível superior são de analista judiciário nas áreas judiciária, administrativa, análise de sistemas, assistência social, contabilidade, medicina (clínica médica), psicologia e relações públicas.

Os cargos de nível médio são de técnico judiciário nas áreas administrativa, artes gráficas, enfermagem, programação de sistemas e operação de computadores.

As inscrições devem ser feitas pelo site www.concursosfcc.com.br de 12 de setembro a 11 de novembro. A taxa é de R$ 70 para nível médio e de R$ 85 para nível superior.

Tais Laporta

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