Diretor de filme sobre violência doméstica diz que leis não bastam

14 de julho, 2016

(O Globo, 14/07/2016) ‘Vidas partidas’ foi tema de debate da série Encontros O Globo

Até onde pode ir um amor doentio? A pergunta é o mote de “Vidas partidas”, filme do diretor Marcos Schechtman exibido na série Encontros O GLOBO, anteontem, na Casa do Saber O GLOBO. O longa, que estreia no dia 4 de agosto, é inspirado na história de Maria da Penha Fernandes, a farmacêutica que emprestou seu nome à lei 11.340. O projeto começou a nascer enquanto a atriz e produtora Naura Schneider pesquisava o universo da violência doméstica para o documentário “O silêncio das inocentes” (2010), dirigido por Ique Gazzola e idealizado por ela. O material obtido do contato com a realidade das delegacias da mulher não se esgotou no filme, e ela decidiu retomar o tema na forma de ficção.

— Relacionamentos violentos sempre começam como uma relação amorosa. É o mecanismo do amor profundo que mantém a vítima de abuso presa ao marido, junto com a pressão da sociedade, de manter a família unida por causa dos filhos. Nossa protagonista vai à delegacia denunciar o marido, mas, quando o vê sendo carinhoso, pensa em manter a relação — disse o diretor, em debate mediado pelo repórter do Segundo Caderno Fabiano Ristow, logo após a exibição do filme. — A grande questão não é por que alguém entra numa relação dessas, mas por que não consegue sair.

“NÃO BASTAM LEIS PARA A GENTE MUDAR”

Naura vive a protagonista do longa. E conta que, após a primeira exibição de “Vidas partidas” no festival Cine PE, em maio, uma senhora a pegou nos braços e disse: “você acabou de passar minha vida nas telas. Mas eu não sou forte como você e não tive coragem de denunciar”. No debate, a atriz lembrou que, mesmo depois de leis como a Maria da Penha e a do Feminicídio, o Brasil ocupa o quinto lugar no ranking de violência contra a mulher. Para Schechtman, os instrumentos formais não são suficientes:

— Não bastam leis e regras para a gente mudar. É preciso transformar a cultura, e, para isso, as pessoas precisam olhar para dentro de si. Nós realmente queremos que as pessoas saiam do cinema pensando sobre o assunto.

O diretor ressaltou ainda que a história lhe interessou especialmente por não apresentar o marido agressor, vivido por Domingos Montaigner, de forma maniqueísta. Ele contou que começou as filmagens por uma tórrida cena de sexo entre os protagonistas, ajudando os atores a estabelecerem uma relação de cumplicidade. E diz que tomou o máximo de cuidado para retratar a interdependência do casal, em vez de mostrá-los nos papéis de vítima e algoz.

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