Cem por cento das brasileiras, independente de idade, escolaridade, nível social ou raça, já ouviram falar da Lei Maria da Penha, que completou dez anos no ano passado, revela a pesquisa “Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher” (Data Senado, 2015). Ainda assim, a violência contra a mulher segue sendo uma epidemia no país.
(Folha de S.Paulo, 23/05/2017 – acesse no site de origem)
Um problema tão desafiador demanda respostas inovadoras e consistentes. Um exemplo é o Fundo Fale Sem Medo, parceria do Fundo ELAS – único fundo de investimento social do país voltado exclusivamente para mulheres – com o Instituto Avon.
Como parte dessa parceria, já foram lançados três editais para conceder doações a projetos elaborados por organizações de mulheres que usam diferentes abordagens para enfrentar a violência doméstica.
Por seu ineditismo e eficácia, o Fundo Fale Sem Medo foi reconhecido internacionalmente como “case” de sucesso pela Business for Social Responsibility – organização global sem fins lucrativos que trabalha com uma rede de mais de 250 empresas na construção de um mundo justo e sustentável.
Com um investimento de R$ 6,7 milhões, o Fundo Fale Sem Medo já apoiou 77 projetos de todo o país, alcançando 25 Estados, 276 municípios e mais de 52 mil beneficiários diretos entre mulheres, homens, jovens, estudantes, mulheres com deficiência, negras, lésbicas, mulheres indígenas, pescadoras, agricultoras familiares, trabalhadoras domésticas, mulheres trans, mulheres de terreiro, quilombolas.
Mulheres como a agricultora Maria do Socorro, de Bacabal, no Maranhão. Ela relata que “muitas mulheres achavam que sofrer violência era só apanhar, mas agora aprendemos sobre os diversos tipos de violência que uma mulher pode sofrer”.
Ou como Cirleide, moradora de Macaíba, no Rio Grande do Norte, que tinha vergonha de denunciar a violência que sofria. “Perante a sociedade, você ter sido vítima do seu marido é uma vergonha. Mas hoje não me sinto mais envergonhada, me sinto consciente”, diz.
Apesar de as pessoas terem ouvindo falar da Lei Maria da Penha, em pesquisa com as 33 organizações apoiadas em 2016 verificamos que quase 70% dos grupos consideram que a falta de compreensão ou desconhecimento sobre a questão por parte da população é um impedimento para o fim da violência doméstica.
Os projetos buscam promover a mudança de comportamento de homens e mulheres e a incidência em políticas públicas, realizando parcerias com órgãos e instituições municipais, estaduais e federais.
Para transformar a realidade de Maria, Cirleide e de tantas outras mulheres Brasil afora, é preciso envolver diferentes setores da sociedade e investir em ações coletivas e integradas.
Desde 2000 o Fundo ELAS atua nesse sentido, estabelecendo parcerias com organizações que atuam de modo coordenado, cada uma em sua área de expertise, para construir um país com equidade de gênero.
Com uma metodologia pioneira que inclui cocriação, horizontalidade, isonomia na seleção de projetos e os nossos “Diálogos” – encontros em que os grupos fortalecem sua atuação em rede e desenvolvem estratégias conjuntas -, produzimos impacto coletivo com parceiros da iniciativa privada que buscam inovar investindo conhecimento e recursos financeiros em organizações da sociedade civil que trabalham pela solução dos problemas gerados pelas desigualdades de gênero.
Assim avançamos em nossa missão de promover e fortalecer o protagonismo e os direitos das mulheres, certas de que a desigualdade de gênero é um problema de todos nós, e só será resolvido quando as habilidades e os recursos de todos nós – empresas, sociedade civil e governo – estiverem alinhados para esse objetivo.
*Amalia Fischer é socióloga, doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ, idealizadora, cofundadora e coordenadora geral do ELAS Fundo de Investimento