Jornalista analisa a situação das mulheres negras brasileiras a partir do histórico discurso em que a ex-escrava Sojourner Truth, nos EUA de 1851, questionou: ‘Não sou eu uma mulher?’
(O Globo, 20/11/2019 – acesse no site de origem)
Quando questionou “não sou eu uma mulher?” durante uma convenção de mulheres em Akron, Ohio, em 1851, Sojourner Truth não calou apenas os homens que tentavam inviabilizar a luta pelo direitos das mulheres, silenciou também as feministas brancas que vaiaram quando a ex-escrava posicionou-se para discursar.
‘Quem nunca foi chamada na escola de cabelo de bombril?’ questiona a colunista do Globo Flávia Oliveira. Ela e outras mulheres negras da redação de O Globo e Extra, jornalistas ou não, contam neste vídeo como foi o processo de aceitação do cabelo natural, marcando o dia internacional da mulher negra latino-americana e caribenha, em 25 de julho.
Não são percepções subjetivas, são dados estatísticos do Atlas da Violência 2019, do estudo “A cor da dor: iniquidades raciais na atenção pré-natal e ao parto no Brasil” 2017 da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz) e da Pesquisa Nacional de Domicílios Contínua trimestral do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IGBE), respectivamente.
Como vivem as mulheres negras? Sendo a base da pirâmide sociorracial brasileira, vivem o pior que o país tem a oferecer.
A empatia é palavra invisível na prática. Sororidade de mulheres brancas com negras é item de colecionador, raríssimo. O que garante a sobrevivência de pretas e pardas nesse país historicamente hostil é o conceito de dororidade, cunhado pela intelectual Vilma Piedade, a solidariedade e aliança entre mulheres negras que surge a partir de experiências dolorosas com o racismo.
Negras continuam ansiando por movimentos de diversidade interseccionais, ou seja, que além de questionar os papéis de gênero, pensem principalmente em como raça e classe são determinantes para a vivência em sociedade.
Enquanto isso, fico com Martin Luther King que afirmava que “a compreensão superficial das pessoas de boa vontade é mais frustrante do que a incompreensão absoluta daqueles de má vontade. A aceitação indiferente é mais desconcertante que a rejeição direta.”
Não é mais somente sobre representatividade. Além de condições de sobrevivência e qualidade de vida, faltam proporcionalidade e cadeiras cativas nos espaços de poder. É tempo de largar o osso.
Por Isabela Reis