(El País, 15/11/2015) A população brasileira que se autodeclara negra ou parda está aumentando na última década. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2014, realizada pelo IBGE e divulgada nesta sexta-feira, 53% dos brasileiros se declararam pardos ou negros no ano passado, diante de 45,5% que se disseram brancos. Há dez anos, em 2004, 51,2% dos brasileiros se diziam brancos diante de 42% pardos e 5,9% negros (totalizando 47,9% de negros e pardos), apontando para a predominância da população brasileira que se autodeclarava branca. Foi em 2007 que os números viraram, quando 49,2% se disseram brancos, 42,5% pardos e 7,5% negros (totalizando 50% de negros e pardos). Desde então, o número de pessoas que se diz negro ou pardo só faz crescer.
Adriana Beringuy, técnica do IBGE, afirma que esse percentual não tem relação com o aumento da taxa de natalidade entre os negros e pardos. O fator mais determinante, segundo ela, é a autodeclaração. “Pode ser que também esteja aumentando a miscigenação entre as pessoas”, diz. “Mas o que observamos mesmo é a predominância da autodeclaração”.
Para Katia Regis, coordenadora da primeira licenciatura do Brasil de estudos africanos e afro-brasileiros, o crescimento da população que se autodeclara negra é o reflexo dos anos de luta do movimento negro e também do acesso à educação. “A população negra que tem mais acesso ao conhecimento efetivo da história africana e afro-brasileira passa a se ver mais positivamente como negra”, diz. Conhecendo sua história, os negros assumem o orgulho da sua cor.
O curso criado por Katia e mais dois professores em maio deste ano na Universidade Federal do Maranhão tem como objetivo valorizar a diversidade. “Um currículo eurocêntrico não contribui para mostrar a diversidade brasileira, apenas para mostrar a desigualdade racial”. O Maranhão é o Estado com a maior população negra do Brasil: 80%, segundo o IBGE. Em seguida, vem a Bahia, com 79,3%.
Apesar do orgulho crescente, os negros se dividem entre a satisfação com a própria cor e a realidade diferente para cada grupo étnico no Brasil. Essa é a parcela da população que mais sofre com a violência, salários menores e crimes racistas no país. Segundo o Mapa da Violência, divulgado na semana passada, o assassinato de mulheres brancas caiu 10% na última década (entre 2003 e 2013), enquanto o de mulheres negras subiu 54%. O mesmo acontece com os assassinatos por arma de fogo. Enquanto entre a população branca houve queda de 23%, a quantidade de vítimas negras cresceu 14% entre 2003 e 2012.
Também são os jogadores de futebol negros os que sofrem com racismo em campo, e são as mulheres negras que ganham até 75% menos que os homens brancos nos mesmos postos de trabalho. A dicotomia entre o orgulho e o preconceito de ser negro no Brasil fez com que mulheres negras encabeçassem a última marcha das mulheres contra o PL 5069, realizada em São Paulo e no Rio de Janeiro nesta quinta. “Serão os nossos filhos que mais sofrerão com a redução da maioridade penal e seremos nós as que mais sofreremos se esse PL for aprovado”, disse Maria das Neves, da Marcha das Mulheres Negras. “Nós acabamos com a escravidão, mas ainda não nos libertamos das correntes do racismo”.
Marina Rossi
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