Ministra ouviu ‘ponha-se no seu lugar’ e reagiu com firmeza. Episódio revelou tentativa de silenciamento diante da força de quem já superou obstáculos muito maiores.
O que se viu nesta terça-feira (28), no Senado, foi uma cena de brutalidade explícita.
Não houve tentativa de vencer no argumento ou no debate. Houve tentativa de vencer no ataque.
Durante uma audiência na Comissão de Infraestrutura, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi interrompida várias vezes e teve o microfone cortado pelo presidente da sessão, o senador Marcos Rogério (PL-RO). A discussão chegou ao auge quando ele se virou para Marina e disse: “ponha-se no seu lugar”.
A frase provocou tumulto e foi seguida de mais provocações. O senador Plínio Valério (PSDB-AM), por exemplo, afirmou que era preciso separar “a mulher da ministra” — porque, segundo ele, “a mulher merece respeito, a ministra, não”.
Marina decidiu deixar a sessão. Em entrevista depois do episódio, disse que se sentiu agredida, mas saiu fortalecida. “Eles não conseguiram me intimidar”, afirmou à GloboNews.
A reação da ministra ajuda a dimensionar o peso do episódio. Mas é ainda mais revelador lembrar de onde ela veio.
Marina nasceu em uma comunidade seringueira no Acre. Em 2014, durante um comício, ela contou uma das memórias mais fortes da infância:
“Tudo o que minha mãe tinha para oito filhos era um ovo e um pouco de farinha e sal com umas palhinhas de cebola picadas. Eu me lembro de ter olhado para o meu pai e minha mãe e perguntado: ‘vocês não vão comer?’ E minha mãe respondeu: ‘nós não estamos com fome’. E uma criança acreditou naquilo. Mas eu depois entendi que eles há mais de um dia não comiam.”
É essa menina, forjada na privação, que se tornou ministra de Estado, candidata à Presidência e uma das vozes mais respeitadas do mundo na pauta ambiental. Não se intimida diante de brutamontes — nem da oposição, nem do governo. Homens que dificilmente alcançarão o local que Marina já ocupa na História.
Em nota, o senador Marcos Rogério disse que Marina foi “quem primeiro se exaltou, a partir de uma discussão travada com o senador Omar Aziz”, que foi “seguidamente interrompido pela ministra que, apontando o dedo, dirigiu-me uma acusação desconexa, de não ter me importado com o que ela chamou de ‘ditadura’, e que, sua expressão de ter advertido a ministra a “se colocar em seu lugar” está sendo “deturpada e explorada pelo patrulhamento ideológico da esquerda”.
Ministra diz sair fortalecida
Em entrevista ao Mais, da GloboNews, Marina disse que saiu mais fortalecida após os embates.
“Eu saí dali mais fortalecida. Eles não conseguiram me intimidar”, disse a ministra na entrevista. “Ninguém vai dizer qual é o meu lugar.”
Após o embate, o presidente Lula (PT) ligou para a ministra: “O presidente Lula fez questão de ligar para mim […] Eu fiz questão de perguntar como ele estava, porque eu estava preocupada com a saúde dele, não queria levar mais questões. E ele fez a questão de dizer: ‘Passei a me sentir melhor depois que você tomou a decisão de se retirar daquela comissão. Você fez o que era certo, de não tolerar desrespeito'”.
Ofensas em comissão
A ministra foi alvo de ao menos três parlamentares ao participar de audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado, nesta terça-feira (27).
A discussão começou quando Marina disse que se sentiu ofendida por falas do senador Omar Aziz (PSD-AM) e questionou a condução dos trabalhos feita por Marcos Rogério, que presidia a sessão na Comissão de Infraestrutura do Senado.
Rogério havia cortado o microfone de Marina várias vezes, impedindo-a de falar, e ironizou as queixas dela. A ministra respondeu dizendo que ele gostaria que ela “fosse uma mulher submissa”. “E eu não sou”, completou Marina.
Sentado ao lado da ministra, Marcos Rogério olhou para ela e disse: “Me respeite, ministra, se ponha no teu lugar”. A declaração provocou novo tumulto e ele tentou se explicar. Disse que, na verdade, referia-se ao “lugar” de Marina como ministra de Estado.
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