“O Brasil de 2018 enfrenta a insuficiência de investimentos financeiros para a implementação de leis e políticas substantivas de enfrentamento à violência contra as mulheres”. A avaliação é da gerente de programas da ONU Mulheres no país, Joana Chagas, que participou em abril do Simpósio Regional sobre Violência de Gênero. Evento foi realizado em Campo Grande pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul.
(ONU Brasil, 02/05/2018 – acesse no site de origem)
A especialista da agência das Nações Unidas ressaltou que proteger mulheres e meninas das situações de violência exige a mobilização de diversos setores da sociedade, como determina a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.
“A complexidade da violência contra as mulheres e meninas demanda respostas políticas multissetoriais, como também estabelece a Lei Maria da Penha ao evocar ações integradas em saúde, segurança pública, justiça, educação, psicossocial e autonomia econômica”, explicou a gerente de programas durante o encontro, que ocorreu entre os dias 4 e 6 de abril.
O simpósio reuniu cerca de 400 profissionais da magistratura, delegacias, promotorias, defensorias, psicologia, assistência social e universidades, bem como ativistas e estudantes, vindos dos estados do Piauí, Rio Grande do Norte, Goiás, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e do Distrito Federal.
A juíza Jacqueline Machado, que responde pela Coordenadoria da Mulher do MP do estado, elogiou o envolvimento de especialistas de diferentes áreas. “A violência contra a mulher se alimenta do machismo e da desigualdade de gênero e, nesse sentido, desconstruir esses padrões culturais por meio do diálogo entre o direito e outras ciências como a psicologia, sociologia, neurociência, serviço social, literatura e jornalismo é uma das formas mais eficazes de combater esse mal e evoluir como sociedade.”
Violência de gênero no Nordeste
Lembrando dados da Pesquisa de Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Joana alertou que, entre as mulheres que são vítimas de agressão, as desigualdades de gênero tendem a se aprofundar após o episódio de violência.
Em 2017, 27% das brasileiras do Nordeste, com idades entre 15 e 49 anos, foram vítimas de violência doméstica. Na região, 17% das mulheres já foram agredidas fisicamente pelo menos uma vez. Das 10 mil entrevistadas para o levantamento, cerca de 600 sofreram agressões físicas durante uma gestação. Desse grupo, 77% eram mulheres negras.
Ao longo do período de realização da pesquisa, entre 2016 e 2017, 23% das mulheres agredidas recusaram ou desistiram de uma oportunidade de emprego porque o parceiro era contra.
A análise também apurou que as trabalhadoras que sofreram agressões apresentaram queda na produtividade, além de permanecer no emprego por um tempo 21% menor em relação às outras entrevistadas. Seus salários também eram 10% menores do que o das mulheres que não passaram pela mesma situação. As consequências se agravam entre as mulheres negras.
“A pesquisa traça um quadro mais delineado dos desafios do Brasil para alcançar a meta global para a eliminação da violência, igualdade de gênero e empoderamento das mulheres até 2030. Um passo decisivo é a continuidade de estudos e a produção de outras pesquisas nas demais regiões do Brasil. Esses estudos são fundamentais para a formulação e a execução de políticas públicas de prevenção e de enfrentamento da violência de gênero”, argumenta Joana.
Judiciário pela igualdade de gênero
Joana lembrou ainda das contribuições do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, uma das instituições que tem colaborado para a implementação das Diretrizes Nacionais para Investigar, Processar e Julgar Mortes Violentas de Mulheres com Perspectiva de Gênero. As orientações foram propostas pelo Ministério da Justiça, pela Secretaria de Políticas para as Mulheres, pela ONU Mulheres e pelo escritório regional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos para a América do Sul.