22/03/2012 – ‘Não há investimentos para mulheres’, diz secretária de enfrentamento à violência

22 de março, 2012

(Gabriel Bonis, da Carta Capital) Após mais de cinco anos da Lei Maria da Penha em vigor, legislação que endurece as penas em casos de agressão a mulheres, o Brasil ainda apresenta uma estrutura de atendimento à violência de gênero extremamente deficitária.

Menos de 10% dos municípios do País possuem delegacias especializadas no combate à violência contra a mulher, segundo dados anunciados nesta semana pela Secretaria de Políticas para as Mulheres. Ao todo são 374 delegacias em cerca de 7% das 5,5 mil cidades brasileiras.

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Com menos de 400 delegacias da mulher no País, secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres diz que estados e municípios não entedem a importância do serviço. Foto: Elza Fiúza/ABr

Além disso, existem apenas 589 unidades de atendimento especializado, como centros de referência e abrigos no País.  “Esse número reflete a maneira como a sociedade brasileira tem tratado nas últimas décadas a violência contra a mulher”, afirma Aparecida Gonçalves, secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, em entrevista a CartaCapital.

Segundo ela, não existe investimento efetivo em políticas públicas para as mulheres no Brasil e a institucionalização de uma política nacional sobre o assunto é recente, assim como o debate da importância de serviços específicos. “Ainda existe muita dificuldade de prefeitos e governadores em entender a importância deste tipo de unidades, pois muitos alegam não ter recursos e estrutura para montá-las.”

Uma afirmação refutada pelo Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, que disponibiliza recursos a fim de ajudar estados e municípios a criar serviços especializados, aponta.  “Precisamos ter condições políticas de negociação, pois não basta liberar verbas. É preciso vontade política ou essas unidades vão abrir, mas acabarão fechando.”

Essas condições ganham maior força pelo fato de o Brasil ser governado atualmente por uma mulher, acredita a secretária nacional Aparecida Gonçalves. “É um incentivo porque dá maior visibilidade ao problema, além de o enfrentamento à violência contra a mulher ser uma prioridade do governo Dilma Rousseff.”

“A presidenta tem dito desde a sua posse que quer maior rigor na aplicação da Lei Maria da Penha e isso também nos dá condições efetivas de ter mais recursos”, diz.

Em fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) endureceu a lei e definiu que o Ministério Público pode denunciar o agressor mesmo sem uma queixa formal da mulher. A investigação pode ser aberta inclusive por meio de informações passadas por vizinhos.

Apesar dos resultados ruins na estrutura de atendimento, o governo acredita que o pacto assinado em 2007 tem apresentado resultados dentro do esperado, como o aumento de 109% do número de serviços no País. A meta agora é chegar ao menos em 10% dos municípios em quatro anos e elevar o número de serviços especializados.

Por outro lado, a secretária destaca que a estrutura precária da rede de atendimento impede a recuperação adequada da vítima, que em quase 70% dos casos, segundo dados da Secretaria, sofre violência há mais de 10 anos.

“Precisamos de um serviço que dê o acompanhamento psicológico e social a essa mulher. A delegacia sozinha não dá conta”, diz.

Gonçalves aponta que a situação é ainda pior nas cidades menores, pois a maioria dos centros de apoio fica nas capitais.

A falta de delegacias especializadas também deixa a mulher mais vulnerável, pois a vítima precisaria recorrer ao serviço “comum” para registrar a queixa e enfrentar, muitas vezes, o descaso de indivíduos não qualificados para este tipo de atendimento. “Isso acaba gerando aquele tipo de questionamento à vítima: ‘tem certeza que a senhora vai fazer isso? Seu marido vai ser preso’.”

Comportamento que leva à subnotificação de casos e impede a composição de dados oficiais a quantificar a incidência da violência doméstica no Brasil. “Isso faz com que a mulher desacredite na proteção do Estado. Ou ela retorna ao seu agressor ou acaba tendo que encontrar seu caminho sozinha.”

Uma situação também refletida na América Latina em geral, segundo o estudo O Progresso das Mulheres no Mundo, anunciado pela ONU na quarta-feira 21. Dados de 2011 mostram que uma em cada três mulheres da região sofre algum tipo de violência e 16% delas já foram vítimas de constrangimento e abuso sexual alguma vez na vida.

Situação que ocorre em um cenário no qual 97% dos países aprovaram leis severas contra a violência de gênero.

Acesse em pdf: ‘Não há investimentos para mulheres’ (Carta Capital – 22/03/2012)

A falta de estrutura e de recursos para o atendimento de mulheres vítimas de violência e o grande no número de agressões no Brasil foram o foco da audiência pública promovida pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência Contra a Mulher

 

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