Em 2021 houve um aumento de 41,9% das mortes de gestantes no País; principal causa é negligência dos serviços de saúde, diz Cristiane da Silva Cabral
Muito foi discutido sobre a vacinação das grávidas ou se o vírus da covid-19 era transmitido ao bebê caso a mãe fosse infectada, mas toda a mudança fisiológica que acontece no corpo de uma gestante não foi efetivamente levada em conta. Elas estão mais suscetíveis ao vírus porque seu sistema imune está mais fragilizado.
Um seminário promovido nesta semana pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP se propôs a discutir a saúde sexual e reprodutiva pós-pandemia de covid-19. Um dos efeitos mais marcantes e preocupantes abordados pelo seminário foi a situação das grávidas e puérperas durante a pandemia. A taxa de infecção e mortalidade aumentou exponencialmente, enquanto o atendimento e tratamento daquelas infectadas pelo vírus diminuiu.
Com a reorganização dos hospitais e a destinação de leitos de maternidade e parto, internação e serviços pré-natais aos infectados pela covid-19, a atenção às grávidas foi deixada não em segundo plano, mas sim em terceiro. “O serviço de saúde foi desmantelado e os efeitos disso para a saúde reprodutiva são enormes”, explica Cristiane da Silva Cabral, do Departamento de Saúde, Ciclos de Vida e Sociedade da Faculdade de Saúde Pública da USP.
“Uma das coisas que a gente discute muito são os indicadores de mortalidade materna, a gente tinha diminuído cada vez mais a quantidade de morte materna por 100 mil habitantes. Agora, a gente voltou aos patamares dos anos 90, em função da pandemia”, diz a professora. Dados de um estudo da Fiocruz Amazônia apontam que, durante os cinco trimestres consecutivos avaliados – março de 2020 a maio de 2021 –, foram identificadas 3.291 mortes no Brasil. Isso representa 70% de mortes além do esperado.
Os dados são mais preocupantes porque as mortes poderiam ter sido evitadas. A causa do aumento da mortalidade assusta mais ainda: a forma como a pandemia foi gerenciada não levou em conta a saúde da mulher grávida. Segundo um estudo publicado na Lancet Regional Health – Americas, uma em cada três mulheres grávidas com covid-19 em situação de tratamento intensivo não recebeu o atendimento necessário. Esse mesmo estudo conduziu uma pesquisa com 25 parentes de grávidas que morreram por conta da covid-19. Foi revelado que algumas grávidas chegaram a ir em cinco centros de saúde antes de receberem atendimento.