O crime de estupro é uma violência presente no cotidiano, suas raízes remontam a matriz histórica patriarcal e misógina que constituíram (e constituem) o Brasil. A tipificação penal dessa prática criminosa, originalmente, conforme o Código Penal, em seu artigo 213, se dava pelo ato de constranger uma mulher, por meio de violência ou grave ameaça, à conjunção carnal. A referida disposição limitava o sujeito que podia ser vítima da violência (pessoa do sexo feminino) bem como o ato violento, já que para configuração do crime o constrangimento deveria ter como consequência a cópula vagínica.
Diante das alterações acerca da organização social e suas formas de estabelecer relações a partir dos instrumentos tecnológicos, o crime de estupro foi alvo de modificações por meio da Lei nº 12.015/2009, a qual conferiu à dignidade sexual, através de interpretações sistêmicas e teleológicas (GRECO, 2011), um patamar de relevância equivalente ao princípio da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, o ordenamento jurídico brasileiro associou o artigo 213 (estupro) ao artigo 214 (atentado violento ao pudor), de modo que o crime de estupro teve sua definição alterada, e passou a ser configurado como a ação de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” (BRASIL, 1940).