(Folha de S.Paulo) Planos da Anatel para reduzir tarifas da telefonia celular no país precisam disseminar informações técnicas e passar por consulta pública
Um conselheiro da Anatel, agência federal que regula o setor de telefonia, indicou em declarações a esta Folha que estão em estudos mudanças relevantes no mercado brasileiro de telefonia celular.
As operadoras ficariam proibidas de cobrar preços diferentes nas ligações dentro de suas redes (ou seja, para linha de celular da mesma operadora) e fora de suas redes (para celular de outra operadora). A fim de preparar essa mudança, seria extinta a taxa de interconexão paga pelo cliente que faz a ligação para a operadora que recebe a ligação.
A intenção seria coibir a prática das operadoras de oferecer preços mais baixos nas ligações entre seus celulares, pelo entendimento de que esse mecanismo de fidelização de clientes na prática limita a concorrência no setor.
Trata-se de uma tese no mínimo polêmica. É evidente que os descontos nas ligações dentro da rede da operadora -que com frequência chegam a 100%, tornando a ligação gratuita- têm diminuído o preço médio das ligações.
Isso pode ser entendido como um reforço, e não uma redução, da competição em preços entre as operadoras. A prática tem amenizado o problema, notório, do alto custo das ligações de celular no Brasil.
Quanto à extinção da taxa de interconexão, a mera menção dessa possibilidade redundou num rebuliço no mercado e em oscilação nos preços das ações das operadoras de celular. O que não deve surpreender ninguém: essa taxa responde por nada menos que 35% do faturamento das empresas.
O que surpreende, e incomoda, é que dirigentes da própria agência que regula o setor façam circular informação preliminar com tamanho potencial de impacto.
A Anatel apressou-se a negar que pretenda extinguir a cobrança da taxa de interconexão. Anunciou que os estudos se encontram em etapa inicial e dizem respeito apenas a mudanças na forma de apropriação das receitas de interconexão. Hoje todos pagam para todos; a alternativa seria cada operadora auferir as receitas de interconexão geradas por seus clientes.
O episódio todo poderia ter sido evitado. Bastaria a Anatel adotar padrões mais sólidos para disciplinar a circulação de informações a respeito de possíveis futuras mudanças nas regras da telefonia.
No plano internacional, é frequente que as agências que regulam setores econômicos utilizem a ferramenta de Análises de Impacto Regulatório (AIR). São estudos de fundo apresentados à sociedade com as mudanças propostas, de modo a enriquecer a discussão sobre sua conveniência.
No Brasil, a agência que regula os transportes terrestres (ANTT) já incorporou as AIRs em sua prática. A Anatel deveria seguir o exemplo.
Acesse em pdf: Linha cruzada, editorial (Folha de S.Paulo – 07/04/2012)