De janeiro a novembro de 2024, estado registrou 675 casos de estupro de vulnerável. São 48 casos a mais do que o registrado durante todo o ano passado, uma alta de 7,65%.
O número de casos de estupro de vulnerável em 2024 em Roraima ultrapassou o registrado durante todo o ano passado. Entre janeiro a novembro deste ano, foram 675 registros do crime, uma alta de 7,65% se comparado a 2023, quando o estado contabilizou 627 casos. Os dados são de um levantamento feito pela Polícia Civil à pedido da Rede Amazônica.
Ao todo, foram 48 vítimas a mais este ano — dado que pode aumentar, tendo em vista que o levantamento foi até novembro. Até agora, é como se tivessem dois casos de estupro de vulnerável por dia em Roraima.
O estupro de vulnerável é caracterizado por qualquer ato libidinoso contra vítima menor de 14 anos ou incapaz de consentir por qualquer motivo.
De acordo com o levantamento, entre janeiro de 2022 e novembro de 2024, o estado registrou 1.938 casos do crime, o que equivale a uma média de 646 estupros por ano. Só em 2022 foram 636 notificações de estupro de vulnerável.
Entre as vítimas deste ano estão quatro meninas, todas da mesma família. Elas eram estupradas pelo tio, de 59 anos. O crime foi descoberto em setembro deste ano, quando uma das crianças, de 12 anos, relatou os abusos em uma carta deixada por ela na “caixinha do desabafo” da escola onde estudava.
O relato de que ela era abusada sexualmente foi descoberto durante campanha promovida pela escola para saber das crianças e adolescentes sobre quais eram seus medos, traumas e aflições. A partir desta carta, a Polícia Civil chegou às outras vítimas e o homem foi preso por ordem judicial.
A escola, as vezes, é o lugar onde as vítimas se sentem seguras para contar sobre a violência. Gestora da escola onde a carta foi deixada, Márcia Rocha explica que o projeto é um recurso pedagógico que facilita a assistência a alunos vítimas de violência. Para ela, o ambiente escolar é fundamental para auxiliar na identificação de casos e, principalmente, na prevenção dos abusos.
“Alguns [alunos] colocam o nome [na caixinha], outros ficam de forma anônima. Mas a gente toma conhecimento e começa a busca da ajuda e do acolhimento”, disse a gestora da escola.
“A escola tem que se envolver. Isso é uma demanda cotidiana, é uma demanda da nossa rotina”, ressaltou Márcia Rocha.
Ao longo deste ano, outros casos revelaram a violência sofrida por crianças e adolescentes dentro de casa. Os agressores são pessoas do convívio das vítimas, como pais, padrastos, tios e amigos da família. A aproximação dificulta, em algumas situações, até a formalização da denúncia — as vítimas têm medo.
A Rede Amazônica teve acesso a relatórios policiais que mostram o impacto da violência dentro do lar das vítimas e em ambientes onde elas deveriam se sentir seguras, como na escola. Em um dos casos, o abuso aconteceu dentro da casa da vítima, uma menina de 7 anos, e era cometido pelo padrasto dela.
“Me deparei com minha filha mais velha deitada na cama, segurando uma nota de dois reais. Ele havia ordenado que a mais nova fosse tomar banho enquanto estava com a outra no quarto”, disse a mãe dela, que denunciou o caso às autoridades.
Em outro caso, uma menina não esteve segura nem dentro da escola onde estudava, no município de Mucajaí, ao Sul de Roraima. A vítima, de 13 anos, usava o banheiro da instituição quando foi abordada por um homem, um funcionário da unidade de ensino. Ela foi agarrada e teve as partes íntimas tocadas pelo agressor, que foi preso pelo crime em novembro de 2024.
‘Marcas no desenvolvimento’
De acordo com a psicóloga e especialista em violência doméstica, formada pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), Fernanda Costa, o estupro deixa marcas no desenvolvimento das crianças e adolescentes que são vítimas.
“São vítimas que, às vezes, se culpam pelo que aconteceu. Isso pode gerar problemas de autoestima, dificuldade em confiar nas pessoas e até transtorno de estresse pós-traumático. Muitas delas acabam em relacionamentos abusivos no futuro”, explicou Fernanda Costa.
“É um absurdo justificar o ato com argumentos como a roupa da criança ou a ausência da mãe. Precisamos olhar para o agressor e entender que a violência é um ato inaceitável, independentemente das circunstâncias”, completou.
Em julho deste ano, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública já havia apontado que mulheres e meninas que vivem em Roraima são as maiores vítimas estupro no Brasil na taxa por 100 mil habitantes. O índice no estado é de 193,8, quase três vezes maior que a média nacional de 69,3.
Além da maior taxa de estupro de meninas e mulheres, Roraima tem a maior taxa de estupro geral, ou seja, que também inclui meninos.