Camponesas nigerinas fazem contribuições em dinheiro e em produtos para fortalecer a luta anticolonial no país africano
As mulheres sempre estiveram na vanguarda das lutas populares no Níger. O exemplo de Saraounia Mangou é emblemático e foi retratado em filme. Na década de 1890, enquanto a maioria dos chefes do país da África Ocidental se submetiam ao poder colonial, a chefe e sacerdotisa do povo hauçá liderava o enfrentamento às tropas francesas da missão colonial Voulet-Chanoine, também chamada Missão Centro-Africana-Chade.
Mais de um século depois, a história se repetiu. Durante os protestos em apoio ao levante militar que derrubou o ex-presidente Mohamed Bazoum em 26 de julho de 2023, as mulheres também tomaram as ruas de Niamei e tiveram papel de destaque na expulsão dos 1.500 soldados franceses do país.
É o que explica Hassia Issa, da ONG Millenium Africa, que atua pelos direitos das mulheres nigerinas. “Nos processos de participação patriótica e do Níger, as mulheres estiveram envolvidas do princípio ao fim. Mobilizaram-se para fazer reuniões. Mobilizaram-se para cuidar dos vários pontos que foram bloqueados”, afirma.
“Não foram apenas os jovens e os homens que puderam contribuir. As mulheres estavam lá. As mulheres estiveram presentes no processo desde o 26 de julho”, completa Issa.
O ativismo político acontece em um contexto difícil para as mulheres do Níger. A atuação violenta de grupos fundamentalistas islâmicos na tríplice fronteira entre Níger, Burkina Faso e Mali impôs um deslocamento maciço de famílias rurais, deixando milhares de mulheres e crianças desabrigadas.
“As mulheres nas zonas rurais estão todas preocupadas, porque são elas que vivem com o terrorismo. Elas vivem o terrorismo, elas vivem a injustiça social. Por isso, assim que houve mudanças, elas mobilizaram-se e convergiram para a capital, Niamei, para apoiar as autoridades, para apoiar as suas famílias. As suas irmãs que estão na linha da frente da luta”, avalia a liderança da ONG Millenium Africa.
E ratifica: “Elas contribuíram porque são elas que enfrentam a realidade que estamos vivendo no Sahel. Todos estes constrangimentos ligados ao terrorismo e aos ataques às aldeias, são as mulheres rurais as primeiras vítimas. É uma luta que exige que todos trabalhem em conjunto. Precisamos saber quem são as pessoas que financiam estes terroristas, que lhes dão armas, que lhes dão dólares, euros. Isso tem de acabar. O nosso povo nas aldeias tem de viver em paz”.
A ameaça de grupos considerados terroristas foi a justificativa para a intervenção militar francesa e estadunidense na região a partir de 2013, com a instauração da Operação Barkhane e do projeto G-5 Sahel. No entanto, a presença de tropas estrangeiras não resultou em combate efetivo às milícias islamistas.
Hoje, a principal força de enfrentamento ao terrorismo no Niger tem sido a Aliança dos Estados do Sahel, um pacto militar, político e econômico celebrado com os governos aliados de Mali e Burkina Faso, países que também passaram recentemente por golpes militares apoiados pela população.
As mulheres camponesas têm um papel importante, fazendo contribuições em dinheiro e em produtos para os fundos de solidariedade voltados à soberania do país. Hadjara Ali Soumaila, da Confederação das Mulheres Combatentes e Líderes Panafricanas, fala sobre esse trabalho.
“O terrorismo hoje envolve quase todas as famílias do Níger. E estas mulheres se tornaram fortes, muito fortes, com o golpe. Hoje, elas estão empenhadas em apoiar o CNSP [junta militar], porque agora, com o CNSP, podemos dormir em paz. Podemos fazer o nosso trabalho. Conseguimos arranjar comida para as nossas crianças órfãs”, pontua Soumaila.