A sobrecarga feminina pelo trabalho de cuidado, por Rafaella de Almeida Menezes

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10 de janeiro, 2025 Jota Por Rafaella de Almeida Menezes

O papel da Lei 5.069/2024 para repensar a divisão sexual do trabalho

No dia 23 de dezembro de 2024, foi sancionada pelo atual presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva a Lei 15.069/2024, responsável por instituir a Política Nacional de Cuidados.

De acordo com o artigo 1° da referida lei, a novel Política Nacional de Cuidados se destina a garantir o direito ao cuidado, que compreende o direito a ser cuidado, a cuidar e ao autocuidado, através da corresponsabilização social e entre homens e mulheres.

Dessa forma, o exercício do cuidado, a garantia desse direito e o debate da temática passará a não ser restrito ao âmbito individual das famílias, devendo o setor privado, sociedade civil e Estado compartilhar responsabilidades.

Dentro desse contexto, a lei estabelece como um de seus objetivos a promoção do reconhecimento, redução e redistribuição do trabalho não remunerado do cuidado, realizado de forma preponderante por mulheres (art. 4°, VI). Além disso, tem como escopo a promoção da mudança cultural relacionada à organização social do trabalho de cuidado (art. 4°, VIII).

No cenário atual, a medida legal se apresenta como um instrumento apto a dar visibilidade à necessidade de o cuidado ultrapassar a esfera individual e familiar e, além disso, problematizar e repensar a divisão sexual do trabalho, de maneira que o cuidado seja provido de forma equânime entre homens e mulheres.

A divisão sexual do trabalho expressa a ideia de que homens devem se responsabilizar apenas por atividades que se referem à provisão de recursos materiais, vendendo sua força de trabalho no mercado ou gerenciando seus bens de produção, enquanto as mulheres seriam responsáveis pelas atividades realizadas no âmbito doméstico, destinadas à manutenção da vida e da funcionalidade dos demais membros da família, como cozinhar, lavar, cuidar da saúde, dar suporte emocional e afetivo[1].

Nesse sentido, as atividades de cuidado foram historicamente consideradas apenas como atributo natural da psique e da personalidade feminina, uma necessidade interna da mulher, desempenhada por instinto e por amor, sem valorar o seu potencial econômico[2].

Ademais, a divisão sexual do trabalho tem como princípio hierárquico a valorização do trabalho do homem, colocando como principal premissa que o trabalho do homem vale mais que o trabalho da mulher[3].

Exemplos da manifestação da divisão sexual do trabalho na sociedade encontram-se em dados estatísticos. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2022 as mulheres dedicaram cerca de quase 10 horas por semana a mais do que os homens aos trabalhos relacionados ao cuidado e tarefas domésticas[4].

Esse encargo excessivo do cuidar, principalmente de forma não remunerada, leva à pobreza de tempo, o que cria óbices às possibilidades de inserção e manutenção no mercado laboral, gerando um círculo vicioso da pobreza[5].

Em um cenário mundial, no ano de 2023 foi estimado que 748 milhões de pessoas não conseguiram se inserir e/ou permanecer no mercado de trabalho em decorrência das responsabilidades que envolvem o exercício de cuidados não remunerados. Desse total, 708 milhões eram mulheres e apenas 40 milhões eram homens, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT)[6].

Embora encarregadas pelo exercício dos cuidados de forma dominante, as trabalhadoras domésticas não remuneradas constituem uma parcela invisível da sociedade. Isso porque, o cuidado desempenhado por mulheres é muitas das vezes tido como um recurso natural inesgotável, uma estrutura invisível e indelével, que sequer deve ser levado em conta em razão da suposição que sempre existirá[7].

Não obstante, ao se falar de trabalho de cuidado de forma remunerada, no Brasil tem-se que quase 75% do total de postos de trabalho no setor de cuidados é ocupado por mulheres, ou seja, há aproximadamente 18 milhões de mulheres trabalhando em cargos como o de professora, cuidadora, enfermeira, médica, assistente social, trabalhadora doméstica, dentre outros[8].

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