No mês da mulher, e no dia da divulgação de dados que mostram que as brasileiras nunca sofreram tanta violência, uma mulher usou o palco para prestar um desserviço à causa.
A cantora Baby do Brasil, ex-Novos Baianos e uma figura de importância histórica para a música, pregou o perdão a abusadores.
“Se teve abuso sexual, perdoa. Se foi da família, perdoa”, disse, em tom edificante e evangelizador, a uma plateia lotada numa boate paulistana que já foi um templo de vanguarda.
“Esse discurso não é inofensivo e nem está circunscrito a rodas de fundamentalismo religioso ou misoginia escancarada.”
Não é inofensivo porque, na prática, silencia vítimas que já se sentem isoladas, culpadas, envergonhadas e com medo de denunciar homens violentos. Homens que, na maior parte dos casos, são da família — e que, do abuso pra fora, são carismáticos, simpáticos e até provedores financeiros.
Muitas vezes, essas meninas e mulheres, quando contam o que sofreram, são desacreditadas por gente da própria família — gente que pensa que abusador tem rosto, ou que é possível identificar pelo comportamento se um homem é ou não capaz de cometer violência. Ou mesmo quem acha mais importante manter as aparências ou o provedor dentro de casa do que proteger vítimas de um trauma pra vida inteira.
“Silenciar as mulheres é perpetuar os abusos, deixar de punir e de prevenir que outras violências aconteçam.”
E Baby do Brasil não é a única pregando esse tipo de perdão. Outras religiões e até práticas terapêuticas vêm recomendando que se “compreenda” a origem de abusos sexuais dentro das famílias, deixando que os agressores passem impunes.
Mesmo em crimes que se tornam públicos e que envolvem homens conhecidos, a predisposição para descredibilizar e atacar quem denuncia é bem mais ostensiva do que as vozes que se preocupam em estancar os crimes e impedir que voltem a acontecer.