Estudo se baseou em dados de 14 anos de denúncias ao Disque 100
Qualquer pessoa negra que utiliza redes sociais sabe que muito provavelmente receberá ofensas de todo tipo nos comentários de suas publicações. Os números comprovam: pesquisa que analisou denúncias de racismo e injúria racial no ambiente digital feitas ao Disque 100 —entre janeiro de 2011 e abril de 2025— mostra que, entre os denunciantes que informaram cor, 91% deles eram negros.
A misoginia aliada ao racismo também corre solta: ao cruzar gênero e raça, o estudo aponta que mulheres negras representam 56% de todas as vítimas de denúncias de racismo em ambientes digitais.
As cifras são resultado da pesquisa “Brasil, mostra tua cara: retrato das vítimas de racismo online e o anonimato de seus agressores”, desenvolvida pelo Observatório Racismo nas Redes, do Aláfia Lab. O estudo usou os 1.739 relatos recebidos pelo Disque 100 —canal de denúncias gratuito e sigiloso do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania— nos últimos 14 anos.
Análise da série histórica indica ainda que em 2024 o número de denúncias chegou a 452, o maior volume de registros anuais recebidos pela plataforma desde 2011.
“Olhar para esses dados é fundamental, porque eles nos dão uma visão concreta e nacional do problema. Muitas vezes, o debate sobre racismo online fica restrito a casos pontuais que ganham repercussão na mídia, mas o banco de dados do Disque 100 mostra a dimensão real e cotidiana dessa violência”, diz à Folha Letícia Alcântara, pesquisadora responsável pelo mapeamento e análise dos casos.
Injúria racial e racismo são conceitos jurídicos diferentes. Injúria racial é o crime de ofender individualmente uma pessoa com o uso de palavras depreciativas relacionadas à sua origem étnico-racial. Racismo se refere à discriminação a um coletivo de pessoas. Ambos os delitos estão previstos na lei 14.532 e preveem prisão de dois a cinco anos e multa.
Ainda de acordo com o estudo, dos 91% de denunciantes negros, 66,5% se declararam pretos e 24,5%, pardos. Pessoas brancas representaram 6,8% dos denunciantes, seguidas de indígenas (1,07%) e amarelas (0,6%), que não chegaram a 2% do total. Em um recorte somente de gênero, 61% das denúncias foram feitas por mulheres.