Lançado nesta quarta-feira, estudo faz parte da segunda edição do ‘Nascer no Brasil’ e traz dados inéditos sobre puérperas, cesarianas, amamentação e saúde mental materna
A pesquisa “Retratos do Parto e do Nascimento no Estado do Rio de Janeiro”, lançada ontem pela Fiocruz, aponta que 65% das mulheres sofreram algum tipo de violência obstétrica. Segundo as autoras, o levantamento poderá ampliar o debate sobre o tema, além de contribuir para que a violência obstétrica seja considerada como uma das formas de violência contra a mulher.
Os dados, que fazem parte da segunda edição do estudo “Nascer no Brasil”, foram coletados a partir de 1.923 entrevistas com mulheres que estavam internadas — tanto para o parto, quanto por perda fetal — em 29 maternidades públicas e privadas de 18 municípios fluminenses, entre os anos de 2021 e 2023.
— Nessa pesquisa, aprofundamos o tema da violência obstétrica, fazendo mais de 50 perguntas. No estudo anterior, apenas perguntávamos se a mulher havia ou não lidado com esse tipo de violência, mas, no atual, buscamos ajudá-las a entender o que realmente é a violência obstétrica — explica a biomédica e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Tatiana Henriques, uma das pesquisadoras envolvidas no estudo.
A pesquisa indica que adolescentes e mulheres acima dos 35 anos, com baixa escolaridade e renda, estão mais vulneráveis à violência obstétrica, assim como mães solo e mulheres pretas. Entre as manifestações de violência mais comuns estão toques vaginais inadequados (46%), negligência (31%), abuso psicológico (22%), estigma e discriminação (8%) e abuso físico (3%).
Mães de primeira viagem, além de mulheres que tiveram um trabalho de parto prolongado ou optaram pelo método natural, também apresentaram maiores prevalências de violência obstétrica em algumas das dimensões investigadas.
De acordo com o levantamento, os casos de violência obstétrica são mais recorrentes no Sistema Único de Saúde (SUS), mas ainda bastante presentes nos hospitais privados.
— É um mito dizer que a violência obstétrica não existe na rede privada, uma vez que é um problema macro, que deve ser considerado fruto da violência contra a mulher, enraizada na nossa sociedade — pondera Tatiana.
Segundo a coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal, o levantamento também chama atenção para o aumento do número de cesarianas. Em municípios do interior do estado, o percentual chega a 66%, enquanto em hospitais privados, alcança 85%. Os dados são considerados preocupantes, uma vez que o procedimento é recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) apenas em casos emergenciais.
— Alguns médicos tentam convencer as mulheres de que elas não dão conta de parir seus filhos, mas isso não é verdade — afirma Maria do Carmo. — Uma cesariana desnecessária pode causar complicações anestésicas, questões de trombose e, por se tratar de um corte no útero, pode ainda dificultar uma gravidez futura.