Sociedade não está preparada para pautar o aborto, mas quando estará, ministro?, por Gabriela Cortez Campos

06 de outubro, 2025 Conjur Por Gabriela Cortez Campos

No último dia 22 de setembro, o ministro Luís Roberto Barroso deu entrevista ao programa Roda Viva. Quando questionado sobre a ADPF 442, que visa descriminalizar o aborto praticado no primeiro trimestre de gestação, o ministro afirmou que pretendia pautar o tema durante a sua gestão, mas que acredita que a sociedade ainda não está preparada para lidar com isso. Em suas palavras, são tempos de pacificação do país e pautar o aborto neste momento poderia comprometer esse movimento.

Essa história não é nova. O movimento feminista vem tentando pautar a questão do aborto desde a década de 1970, mas nunca parece ser o momento ideal para isso. Nos anos 2000, com a ascensão do primeiro governo Lula, acreditava-se que havia um clima favorável para isso. Acreditava-se na coalizão exitosa, nas palavras de Lia Machado.

De forma resumida, em 2004, foi formada uma coalizão feminista comprometida com o campo dos direitos sexuais e reprodutivos, a qual tinha como objetivo levar a pauta da descriminalização e regulamentação do aborto para a I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres. A expectativa era que, sendo aprovada, integraria o plano de políticas públicas do governo. Esta articulação consolidou as Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro. Pode-se dizer que a estratégia foi bem sucedida. Aprovada na conferência nacional, instaurou-se a Comissão Tripartite com o objetivo de discutir, elaborar e encaminhar proposta de revisão da legislação que trata sobre a interrupção voluntária da gravidez.

Como resultado, em 2005 foi entregue um anteprojeto de lei que descriminalizava o aborto realizado no primeiro trimestre de gravidez. No entanto, logo após a consolidação desta proposta, eclodiu o Mensalão. O governo então, enfraquecido popularmente, decidiu que não negociaria mais favoravelmente à descriminalização do aborto. Também se priorizou a pacificação social.

Debate é central na política brasileira

Logo após foi criada a “Frente Parlamentar em defesa da vida contra o aborto” e apresentado o Projeto de Lei n° 6150/2005, conhecido como Estatuto do Nascituro. Como reação à investida feminista, grupos contra o aborto buscavam obstaculizar toda e qualquer forma de interrupção da gravidez, inclusive aquelas já previstas no Código Penal.

Nesse momento a questão do aborto também se torna central na política brasileira. Foi tema central de diversos questionamentos em eleições presidenciais e, especificamente na campanha da então futura presidente Dilma, ela foi duramente atacada pelo posicionamento favorável ao tema. Na campanha do Bolsonaro o posicionamento antiaborto também desempenha papel essencial. Há uma união de grupos distintos em prol do ataque aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. A oposição a valores ligados a políticas igualitárias e de diversidade se tornou uma diretriz oficial do bolsonarismo e a obstaculização do acesso aos serviços de aborto foi uma política praticada por diversos ministérios.

Não é preciso conhecer muito a história para perceber que de lá para cá foram poucos os avanços no campo dos direitos sexuais e reprodutivos. Pelo contrário, houve intensas tentativas de retrocesso. A oposição a valores ligados a políticas igualitárias e de diversidade se tornou uma diretriz oficial do bolsonarismo e a obstaculização do acesso aos serviços de aborto foi uma política praticada por diversos ministérios. Cabe relembrar que em 2019, o Ministério da Saúde publicou norma técnica que exigia a apresentação de boletim de ocorrência para comprovação da violência sexual e acesso ao aborto legal, em contradição às boas práticas internacionais e a jurisprudência pátria. A intervenção direta de responsáveis pelo Ministério das Mulher, Família e Direitos Humanos também foi uma das políticas ostensivas adotadas para impedir o acesso ao aborto legal.

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