05/11/2012 – Indianas denunciam aumento de estupros no país

05 de novembro, 2012

(Folha.com) Por quase três horas, oito homens estupraram uma moça de 16 anos. Quando terminaram, eles ameaçaram matá-la se ela contasse a alguém o que tinha acontecido.

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Durante dias, a moça não disse nada. Teria sido difícil fazer uma denúncia, de qualquer maneira, devido à hierarquia das castas. A jovem é pobre e dalit, casta cujos membros antes eram conhecidos como os “intocáveis”. Já a maioria de seus agressores faz parte de uma casta superior que domina a terra e o poder no vilarejo.

O incidente poderia ter se resumido a isso. Porém, os agressores fizeram vídeos com seus celulares do estupro, para exibir como troféu. As imagens começaram a circular entre os homens do vilarejo, até que uma delas foi mostrada ao pai da vítima. Arrasado, o pai cometeu suicídio em 18 de setembro, bebendo pesticida.

Enfurecidos, os dalits exigiram justiça. “Pensei: ‘Perdi meu marido, perdemos nossa honra'”, contou a mãe da jovem. “De que adianta o silêncio agora?”

O silêncio frequentemente cerca os estupros na Índia, especialmente em vilarejos, onde a vítima normalmente é vista como uma mulher desonrada.

Mas o ultraje suscitado por uma sucessão de estupros recentes, incluindo esse, no Estado de Haryana, no norte da Índia, rompeu o silêncio e chamou a atenção nacional para o aumento do número de agressões sexuais no país, além de expor a estrutura de poder em Haryana, conservadora e dominada por homens.

Os casos de estupro na Índia cresceram em ritmo alarmante: aproximadamente 25% em seis anos. O aumento reflete, em parte, o fato de mais vítimas estarem denunciando os estupros. Mas outro fator responsável é a mudança na dinâmica de gênero no país, com mais mulheres estudando, trabalhando ou escolhendo seus maridos, o que alguns homens enxergam como ameaça.

Analistas dizem que a Índia tem um excedente de homens jovens, alguns deles desempregados, que abusam de álcool ou drogas e se sentem ameaçados pela nova visibilidade das mulheres.

Em Haryana, grupos de defesa das mulheres ficaram revoltados quando um líder de vilarejo, Sube Singh, apontou o desejo sexual de garotas adolescentes como uma das razões dos estupros. “Acho que as moças deveriam se casar aos 16 anos. Assim, elas terão maridos para satisfazer suas necessidades sexuais e não precisarão buscar satisfação sexual em outro lugar.Desse modo, não haverá estupros”, disse.

De 16 casos recentes de estupro em Haryana, pelo menos seis das vítimas eram dalits. Uma adolescente dalit de Haryana cometeu suicídio, ateando fogo ao próprio corpo, depois de ser estuprada por vários homens.

Haryana é um dos redutos mais ferrenhos do patriarcado feudal da Índia. A preferência social por filhos homens contribui para que alguns casais abortem fetos do sexo feminino, deixando Haryana com a proporção entre os sexos a mais desigual da Índia: 861 mulheres para cada mil homens. Politicamente, a casta jat controla uma rede estadual de conselhos não eleitos, compostos unicamente por homens e conhecidos como khap panchayats.

Os políticos eleitos relutam em enfrentar os khaps, importantes para levar eleitores às urnas, e, com frequência, endossam suas agendas sociais conservadoras, nas quais as mulheres são subservientes aos homens.

No caso do estupro coletivo da moça de 16 anos, dalits formaram um comitê para reivindicar justiça. Cerca de 400 pessoas protestaram diante da sede da Polícia Distrital e também do hospital onde estava o corpo do pai da vítima. “Dissemos à polícia que, a não ser que ela prenda os suspeitos, não vamos levar o corpo”, disse uma mulher chamada Maya Devi. “Não temos terras nem dinheiro. O que temos é a nossa honra. Quando sua honra desaparece, você não tem mais nada.”

Desde então, a polícia prendeu oito homens -sete dos quais são jats- que confessaram participação no ataque.

Muitas garotas dalits desistem de estudar depois do trauma. “Antes eu tinha muitos sonhos. Agora não sei se vou poder realizá-los. Meu pai queria que eu fosse médica. Agora acho que não vou poder fazer isso”, disse a jovem.

Acesse em pdf: Indianas denunciam aumento de estupros no país (Folha.com – 05/11/2012)

 

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