(Folha de S.Paulo) Desde que a presidente Dilma Rousseff anunciou o fim da pobreza extrema no Brasil, várias críticas surgiram.
Não se trata mais do preconceito de que as famílias teriam mais filhos para acessar mais benefícios nem de que o dinheiro seria mal gasto -ambos desmentidos pelos dados disponíveis.
A polêmica da vez diz respeito ao patamar de R$ 70 de renda, considerado baixo para a superação da miséria.
O argumento faz sentido, mas pode encobrir algumas questões importantes.
Segundo o Nobel de Economia Amartya Sen, a pobreza não pode ser definida pela quantidade de dinheiro no bolso. Pobreza é privação de capacidades para participar da vida social e de nela fazer escolhas. Escapar à morbidez precoce ou saber ler e interpretar o mundo são capacidades tão importantes quanto o poder de compra.
É, portanto, mais do que uma questão monetária.
Outra contribuição de Sen foi mostrar que alguém com certa renda pode passar por mais privações do que alguém com menos dinheiro, mas vivendo em outro contexto ou região.
Isto é, a desigualdade importa e restringe as oportunidades das pessoas tanto ou mais do que a falta de uma renda mínima.
O valor de R$ 70 mensais não dá para tomar o metrô duas vezes ao dia em São Paulo, mas pode ser crucial para uma pessoa no interior do Nordeste comprar medicamentos ou material escolar.
NOVAS METAS
É por isso que, se a polêmica se limitar ao valor repassado às famílias, haverá um empobrecimento do debate público sobre o tema. Atingimos uma meta importante. A sociedade deveria agora olhar adiante e estabelecer algo como Novas Metas do Combate à Pobreza.
Nos próximos dez anos, qual a renda, a escolaridade, a expectativa de vida que se quer para os brasileiros?
Qual a diferença aceitável entre os que vivem mais, ganham mais e os que vivem ou ganham menos?
Por trás destas perguntas há outra mais difícil: a sociedade brasileira aceita fazer um pacto em torno de uma iniciativa mais ousada para a superação duradoura da pobreza e pagar por ele?
ARILSON FAVARETO é sociólogo, professor da Universidade Federal do ABC e pesquisador do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento)
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