(Folha de S.Paulo) Quando Chrystiane Vasconcellos, 26, foi estudar inglês em Nova York em 2008, não imaginava o que enfrentaria. Envolveu-se com um americano que, mais tarde, a submeteria a chantagens, ameaças e violência física.
Quando Jeanete Santos, 53, há quase 30 anos, cruzou a fronteira do México com seu filho nos braços em busca de seu marido que se aventurara um ano antes, também não sabia que quem os esperava era o homem que depois tentaria matá-la com uma faca.
Ao denunciarem os abusos, as brasileiras encontraram na legislação americana o caminho para escapar de seus algozes e viverem legalmente nos Estados Unidos.
Chrystiane e Jeanete são beneficiárias de um tipo de visto de permanência pouco conhecido, modalidade que protege imigrantes vítimas de abuso. A ideia é amparar um segmento tido como especialmente vulnerável.
“É um direito que deixa de ser aproveitado por muitas pessoas porque, além do próprio trauma, existe o desconhecimento e o medo de procurar a polícia, por estarem em situação de ilegalidade”, diz Ricardo Braxtor, presidente do Brazilian Civic Center, entidade de apoio a brasileiros nos EUA.
“Sentimos que isso tem mudado com a nova atitude do governo, que parece ter ficado mais maleável para reformas na imigração. Nos últimos meses, isso vem estimulando as pessoas a buscarem informação e apoio legal”, afirma.
VISTO U
A estimativa para 2013 é de alta no número de pedidos para o chamado “visto U”, que abrange vítimas de crimes provocados por americanos ou estrangeiros, como estupro, violência doméstica, tortura e outras situações que tenham ocorrido em território americano ou violado as leis do país. Para ter o benefício, a vítima de abuso precisa contribuir com a investigação ou a acusação.
O volume de aprovações é limitado a 10 mil todos os anos. Neste ano fiscal [iniciado em outubro de 2012], superou 3.560 até janeiro.
Em alguns casos é possível estender o benefício a familiares. Vítimas masculinas também são aceitas.
Outra categoria, conhecida como Vawa (Violence Against Women Act, ou Lei da Violência contra Mulheres), foi renovada no Congresso há pouco mais de um mês e beneficia com a legalização as vítimas de violência provocada por americanos ou portadores de “green card” (moradia permanente) com quem tenham parentesco.
No Vawa foram 1.690 aprovações entre outubro de 2012 e janeiro, ante 3.305 em todo o ano fiscal anterior.
Para se tornar elegível, a vítima não precisa colaborar em investigações. Também há possibilidade de abrangência para familiares.
A advogada com especialização na área Michelle Viana estima alta na demanda. “Não há como prever com precisão [o aumento]. Tudo indica que pode”, diz.
Segundo Viana, o governo americano está atento à vulnerabilidade dos imigrantes e, por isso, cria mecanismos para protegê-los e estimular que denunciem.
“Qualquer um está sujeito a sofrer esse tipo de crime, não só os que têm situação financeira desfavorável.”
Acesse em pdf: Vítimas de abuso recebem visto nos EUA (Folha de S.Paulo – 05/05/2013)