(A Tarde) Medida foi adotada desde a última quinta-feira pela Secretaria da Segurança Pública.
Desde a última quinta-feira, quem presta queixa em delegacias do estado deve informar dados sobre orientação sexual e cor.
A nova determinação da Secretaria da Segurança Pública (SSP) nos registros de ocorrências policiais visa, segundo o órgão, ampliar o leque de informações sobre vítimas.
No portal do órgão, a SSP informa que “os servidores policiais já estão sendo orientados a solicitar respostas para estes quesitos (orientação sexual e cor)”. No entanto, a medida adotada pela SSP está longe de ser unanimidade e promete render polêmica.
Para a coordenadora do Núcleo LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Paulete Furacão, se o agente pergunta à pessoa a orientação sexual, “está errado”. Segundo a gestora, “tem gente que fica no armário ou não quer dizer, por problemas familiares”.
Segundo Paulete, “o indicado é que o LGBT se auto- declare. A orientação é de o agente não perguntar”.
Servidora
Uma servidora de uma delegacia territorial da capital, que prefere não se identificar, diz ter ficado “surpresa” com a inclusão dos campos sobre essas características das vítimas no momento de registrar a ocorrência policial. “Para mim, é uma situação constrangedora”, reclama a servidora.
Para a funcionária, tem sido difícil cumprir a determinação, “porque, naquele momento, estamos lidando com pessoas em situação de vulnerabilidade, que acabam sendo surpreendidas com perguntas indelicadas. Muitas não estão sabendo nem responder”.
Para a socióloga Vilma Reis, coordenadora do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra (CDCN) – e que considera a nova medida positiva -, a servidora não pode ser culpabilizada por sen- tir-se constrangida em relação às perguntas do formulário.
“Ela não foi preparada para lidar com essa situação, pois, apesar de o Brasil possuir institutos de pesquisa que são referência, lá na ponta a informação não é compartilhada com o servidor, que tem amparo legal para coletá-la”, opina Vilma.
Estado criará alas exclusivas para internos LGBT em novos presídios
Os 11 presídios que serão construídos na Bahia até o fim de 2014 – e quatro unidades que serão ampliadas – terão celas exclusivas para detentos LGBT. A informação é da assessoria da Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap).
As cidades que receberão novas unidades serão Feira de Santana, Vitória da Conquista, Barreiras, Salvador, Irecê, Brumado, Bom Jesus da Lapa, Luís Eduardo Magalhães, Ita-Sebastião do Passé. Já Paulo Afonso, Juazeiro, Itabuna e Feira de Santana terão unidades ampliadas.
Não foi informado o número de celas nem a capacidade. Há confirmação de que os presídios existentes não serão adaptados. Segundo a assessoria, a acomodação ocorrerá “se o interno se identificar como LGBT e quiser ir para a cela específica”.
A presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Enfrentamento à homofobia da Ordem dos Advogados do Brasil (seção Bahia), Jurema Cintra, disse que é favorável à implementação.
“É reivindicação antiga. Violações são cometidas nas penitenciárias, chacota, violência sexual. Pedimos ao secretário Almiro Sena que se empenhasse a ajudar a criar essas celas”, diz a advogada.
Sena disse não saber se o isolamento é necessário, “mas precisa de tratamento específico, pois quando se trata de homossexual, a violência é maior, não só física, mas constrangimento e violência moral. Não dos agentes, mas dos próprios presos”.
Representantes de entidades aprovam novos campos
A inclusão dos dados sobre orientação sexual e cor das vítimas nos registros policiais recebeu o aval positivo do fundador do Grupo Gay da Bahia, o antropólogo Luiz Mott.
Para ele, a iniciativa “bem-vinda” era uma reivindicação antiga do Movimento LGBT. “No Brasil, ainda não há dados oficiais sobre a população homossexual”, afirma, antes de completar: “Com essa medida, esperamos que os órgãos públicos sejam estimulados a formular políticas eficazes para erradicar a ho- mofobia, que é um tipo de racismo anti-homossexual”.
Segundo ele, no ano passado 29 homossexuais foram assassinados na Bahia, contra 13 mortes de janeiro a setembro de 2013.
Coleta
Coordenadora do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra, a socióloga Vilma Reis considera “fundamental” a coleta de dados estratificados que sirvam de base para a construção de políticas públicas.
“Isso já vem sendo feito pelo IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] e Ipea [Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas], mas que, de maneira impressionante, não vem sendo aproveitado pelos órgãos públicos brasileiros”, ela aponta.
Núcleo da Secretaria da Justiça ainda estuda proposta
A criação das alas partiu de pedido da Secretaria da Justiça para cela específica para transexuais. Segundo a coordenadora do Núcleo LGBT da pasta, Paulete Furacão, ainda não há na própria secretaria um posicionamento definido com relação às novas alas.
Segundo ela, desde 2012 equipes vão a presídios ouvir detentos, além de verificar “homofobia institucional”.
“Tem LGBT que não tem problema e os com relacionamento com outros detentos, mas teve duas transexuais que queriam estar em celas separadas. A homofobia que impera do lado de fora está lá dentro também. As novas alas seriam interessantes para quem não está à vontade ou sofre agressão maior”, ressalta Paulete. Mas ela teme reação dos não LGBTs: “Pela superlotação, eles podem ficar revoltados”.
Acesse o PDF: Queixas policiais passam a registrar cor e orientação sexual das vítimas (A Tarde, 01/10/2013)