(Unicamp, 24/04/2014) “Esta lei coloca a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, abrindo para a sociedade uma oportunidade de se conhecer melhor”, afirmou a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Helena Bairros, ao chegar à Unicamp na manhã desta quinta-feira. Ela veio participar do seminário “Educação, Cultura e Igualdade Racial: A Lei 10.639 em Foco”, organizado pela Pró-Reitoria de Graduação (PRG) com apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP), no Centro de Convenções.
Luiza Bairros foi convidada a falar sobre a execução da lei publicada em janeiro de 2003 e que estabelece diretrizes e bases para incluir, no currículo oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”. “Neste momento, a decisão pela efetivação da lei está nas mãos das autoridades de educação dos estados e dos municípios, porque o material para se trabalhar e as possibilidades de formação de professores já existem. É uma questão de os secretários de educação cumprir o que está determinado, contribuindo para que a educação brasileira melhore”.
Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) referentes a 2009, os afro-brasileiros representam 51% da população, ao passo que a intenção da Lei 10.639 é ajudar na superação dos preconceitos e atitudes discriminatórios por meio de práticas pedagógicas de qualidade. “As universidades é que formam professores e, incorporando as determinações da lei, estarão capacitando os profissionais da educação a darem conta do que existe de diversidade na sociedade brasileira, diversidade que precisa chegar à sala de aula”, complementou a ministra.
Ângela Soligo, professora da Faculdade de Educação (FE) e uma das coordenadoras do seminário, ressaltou o objetivo do encontro de promover uma discussão ampla entre Unicamp e instituições do município e representantes da comunidade negra em torno da formação de educadores para a implantação na história da África no ensino regular. “Esta proposta já está instituída em nossa Universidade, mas precisa ser consolidada. É o momento de pensarmos juntos em como ampliar e aprofundar as ações em direção à igualdade racial”.
Como pesquisadora do tema do racismo e tendo orientandos trabalhando justamente em cima da Lei 10.639, Ângela Soligo lembra que Campinas foi pioneira em iniciativas envolvendo a africanidade, há dez anos. “A Região Metropolitana foi assumindo a lei aos poucos, mas de forma incipiente. Muitos professores têm dificuldade para trabalhar com os conteúdos e alguns ainda mostram resistência a esse trabalho. Precisamos lidar com isso para garantir a implantação da lei no chão da sala de aula, no cotidiano, e não como uma ação de 20 de novembro [Dia da Consciência Negra].”
O professor Robert Slenes, do Departamento de História, levaria à mesa do seminário a informação de que a Unicamp passou a receber, a partir de 2002/2003, alunos de pós-graduação negros, que alcançaram a ensino superior por meio do sistema de cotas. “As universidades federais vêm promovendo a ação afirmativa há mais de uma década. Tivemos dois doutorados da Bahia que publicaram dois livros didáticos para a escola secundária, um deles premiado pela Fundação Cultural Palmares e outro com o Jabuti em 2010. São livros que trazem a qualidade da pesquisa acadêmica para uma linguagem mais acessível, com autores negros de primeira linha.”
Cerimônia de abertura
Na mesa de abertura, Ângela Soligo comunicou ao público que na sessão de votação do Plano Nacional de Educação (PNE), na noite anterior, retirou-se a expressão “pela opção da igualdade racial, de gênero e da orientação sexual”, num retrocesso que tornava o seminário ainda mais relevante. Para o deputado federal Renato Simões, que intermediou a vinda da ministra Luiza Bairros à Unicamp, esta votação mostra como setores reacionários da sociedade permanecem atuantes. “A associação da igualdade de gênero e racial com a orientação sexual constituiu uma maioria que poderia ser burlada, caso aceitássemos a chantagem de tirar os gays do texto. Como se pudéssemos separar a pessoa humana em sua dignidade e direitos de forma hierarquizada para atender a interesses retrógrados.”
O professor Luís Alberto Magna, pró-reitor de Graduação, recordou que a ministra da Seppir estivera no mesmo Centro de Convenções um ano antes, para tratar de tema correlato: a inclusão social e racial no ensino superior. “O tema faz parte da meta principal da atual gestão, dos professores Tadeu Jorge e Alvaro Crósta, pautada por ações voltadas à inclusão social e racial, particularmente em nossa Universidade. Ainda hoje estaremos trabalhando em relatórios com essa temática, um deles tratando de vagas nos cursos de graduação.”
Na opinião da pró-reitora de Pesquisa, professora Gláucia Pastore, a implantação da Lei 10.639 nas escolas brasileiras transcende a questão da inclusão racial, por se tratar de uma questão ética fundamental, que é da condição humana. “O tema é de sobremaneira importante para a universidade, pois a pesquisa é uma das formas mais nobres da educação, um instrumento que não deve ser olhado como elitista, ao contrário: todos os grandes pesquisadores estão preocupados muito mais com a inclusão e participação social.”
O coordenador-geral da Unicamp, professor Alvaro Crósta, lamentou que a sociedade brasileira seja ainda marcada por traços racistas que vêm do seu perfil conservador. “A pior marca é a própria negação, por uma parcela expressiva da população, de que o Brasil seja racista. Daí a importância desse evento reunindo a Universidade com setores da sociedade preocupados com a questão. Desenvolvemos ensino, pesquisa e extensão que formam professores e, no contexto desta lei, a importância está justamente na introdução dos temas da arte, da cultura e da literatura negra no ensino do nosso país. Sem mexermos na base, jamais conseguiremos transformar este perfil conservador e racista.”
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