(Gazeta do Povo, 22/06/2014) O governo brasileiro encampou como uma das bandeiras do Mundial o combate à exploração sexual. Conseguiu até forçar a Adidas, uma das patrocinadoras do torneio, a tirar de circulação camisetas de apelo erótico. Gol de honra midiático diante da derrota diária para o turismo sexual durante a Copa. Cada uma à sua maneira, as sedes mantêm o mercado do sexo a pleno vapor enquanto a bola rola nas arenas.
Apontada como capital brasileira prostituição pela imprensa internacional, Fortaleza tem como escritório das garotas de programa a Avenida Beira-Mar. Elas aproveitam o fluxo intenso de torcedores para combinar as saídas. “São R$ 200 por uma hora e meia. Dependendo de como for o cliente, dá para negociar”, diz uma delas à Gazeta do Povo, após livrar-se de um grupo de mexicanos que achou cara a pedida e antes de seguir adiante ao ver que a nova abordagem não daria em nada.
A pressa é justificada pela demanda. São pelo menos cinco homens para cada mulher. Os programas se desenrolam nos hotéis onde os clientes estão hospedados ou em motéis que não dão conta do movimento. Filas de táxi se formam e não é raro alguém sair sem pagar o quarto.
A polícia observa de perto a movimentação, mas não faz nada. As meninas só dispersam quando fiscais da prefeitura se aproximam. Os cafetões avisam, elas migram para outro ponto e seguem o trabalho.
Em Manaus, a prostituição ocorre a bordo de barcos ancorados à beira do Rio Negro. Adolescentes são abordadas no porto e levadas para programas nos motéis fluviais. Com a maior fiscalização ao tráfego de barcos irregulares, abrigar programas entre meninas manauaras e turistas tornou-se uma atividade lucrativa, sem que a polícia faça algo.
“Denúncias chegam até nós, mas quando nos infiltramos e chegamos aos barcos, elas [crianças e adolescentes] negam. Dizem que são namorados e não temos o que fazer”, lamenta a delegada titular da Delegacia Especializada de Assistência e Proteção à Criança e ao Adolescente (DEAPCA), Linda Gláucia.
Denúncias sem comprovação são um obstáculo ao combate da exploração sexual infantil também em Cuiabá. O plantão 24 horas da Delegacia Especializada na Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Deddica) recebeu 30 queixas, mas não conseguiu avançar na investigação de nenhuma.
Outro problema é a combinação entre sexo e drogas. A Gazeta do Povo flagrou uma mulher oferecendo a um turista estrangeiro um programa de R$ 200, com direito a uma carreira de cocaína. A negociação não avançou, especialmente pelo preço. Em Várzea Grande, região metropolitana, onde há grande concentração de motéis, o encontro não sai por menos de R$ 150. Dentro das boates, uma hora chega a custar R$ 2 mil.
Cobrar mais caro foi orientação em Belo Horizonte. Um aumento de 30% sugerido pela Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), que treinou e capacitou as garotas de programa para o torneio. Pelo menos 300 mulheres concluíram o curso de inglês gratuito e levam na bolsa um guia ilustrado para facilitar a comunicação com os turistas. Outras carregam máquinas de cartão de crédito e débito, resultado de uma parceria com a Caixa Econômica Federal que permite parcelar o pagamento do serviço.
Por um maior reconhecimento da profissão, garotas de programa fizeram uma manifestação no dia do primeiro jogo na cidade. Bloquearam uma rua na região central e promoveram uma “pelada” contra um time de universitários. Até cartazes solicitando “zonas padrão Fifa” foram levados.
O termo “zona padrão Fifa” caberia perfeitamente ao Café Bahamas, um dos mais tradicionais de São Paulo. Reaberto recentemente após uma longa batalha judicial, o estabelecimento aumentou seus preços e recrutou garotas do Sul do país para lucrar com a Copa.
“Aqui elas cobravam de R$ 350 a R$ 400 o programa e agora converteram isso para dólares, passando para R$ 900. Essas moças ganham R$ 25 mil por mês e vão passar a R$ 40 mil na Copa”, calcula o dono do local, Oscar Maroni. Dinheiro deixado pelos turistas no país durante a Copa da última maneira que o governo brasileiro esperava.
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