(El País, 27/06/2014) Sendo um homossexual que vivia na Nigéria, meu maior desafio foi ter que escolher entre minha sexualidade e meu trabalho. Em 2004, estava iniciando minha carreira como ator. Acabava de sair da universidade e me dera um papel em Rosas e espinhos, uma telenovela de máxima audiência na Galaxy Television, uma das redes mais populares do país. Meu personagem era Ricardo, o filho único de uma família rica que mantinha uma relação com a empregada da casa. Foi então que começaram a circular rumores sobre minha vida privada, por isso decidi que era hora de falar a verdade. Para isso, aceitei ir ao programa de entrevistas mais popular da Nigéria e falar sobre minha sexualidade.
Quase imediatamente, meu personagem foi eliminado da série. E, junto com meu emprego, também desapareceu minha segurança financeira. Assim como muitos homossexuais e lésbicas na África, tive que escolher entre a liberdade econômica e o encarceramento mental.
Naquele ano, Nigéria e Uganda aprovaram leis draconianas contra os homossexuais, o que desatou um debate mundial sobre Direitos Humanos. Este debate também começou no Banco Mundial, cujo presidente Jim Yong Kim, recentemente declarou que a discriminação institucionalizada “é prejudicial para as pessoas e para as sociedades”.
As palavras de Kim geraram críticas e controvérsias. Em países como Uganda e Nigéria é comum ouvir que a oposição à discriminação contra homens e mulheres homossexuais, bissexuais e transexuais (LGBT, por sua sigla em inglês) por parte dos governos é uma maneira de impor valores “ocidentais” à África. Mas isto supõe que a homossexualidade é “antiafricana”. E, apesar da falta de provas de que algum país ou continente não possua pessoas LGBT (e muitas provas que mostram o contrário), é uma presunção aceita por uma quantidade cada vez maior de líderes africanos.
Em 2006, o então presidente da Nigéria, Olusegun Obasanjo foi um dos primeiros a falar isso. O presidente de Uganda, Yoweri Museveni, seguiu seus passos quando transformou em lei um projeto anti-homossexual em 2014. Outros líderes, desde o presidente da Gâmbia, Yahya Jammeh, até o do Zimbábue, Robert Mugabe, se manifestaram no mesmo sentido.
Estas atitudes oficiais geraram um sofrimento significativo aos homossexuais e lésbicas da África. Na verdade, o preço da homofobia contra os gays em muitos países africanos é doloroso e evidente: sanções legais, ostracismo social e justiça pelas próprias mãos.
No entanto, o que os líderes homofóbicos da África não entendem é que a proteção legal aos coletivos gays não é apenas uma questão de Direitos Humanos, também é uma questão econômica. Kim tem toda a razão e a investigação começou a medir os custos econômicos da homofobia ao explorar os vínculos entre o sentimento anti-gay e a pobreza em países onde as leis e as atitudes sociais condenam as relações entre pessoas do mesmo sexo.
M.V. Lee Badgett, um economista da Universidade de Massachusetts-Amherst, apresentou as descobertas iniciais de um estudo sobre as implicações econômicas da homofobia na Índia em uma reunião do Banco Mundial, em março de 2014. Badgett estimou que a economia indiana poderia ter perdido até 23,1 bilhões de dólares em 2012 em custos de saúde diretos por causa de problemas de depressão, suicídio e disparidades no tratamento do HIV causados pelo estigma e a discriminação contra os homossexuais.
Além destes gastos concretos, ser diferente pode gerar violência, perda de empregos, rechaço familiar, assédio nas escolas e pressão para se casar. Como resultado disto, muitos homossexuais têm menos educação, menor produtividade, menores ingressos, uma saúde pior e uma expectativa de vida menor.
Na Nigéria, eu comecei o Projeto Independente para Direitos Iguais (TIERS) em 2005 com a intenção de responder e atender à crescente quantidade de pessoas que estavam perdendo o emprego por causa das suspeitas sobre sua sexualidade. Durante nosso primeiro ano oferecemos apoio a dezenas delas. Um jovem, Olumide, recebeu uma moradia depois que sua família o expulsou de casa por ser gay. Outro, Uche, foi despedido de seu emprego como cozinheiro depois de ter revelado sua sexualidade. TIERS o ajudou com o alojamento e com uma quantidade de dinheiro para montar seu próprio negócio de serviço de comida. Embora já se tenham passado quase 10 anos, ainda não podem usar seus nomes reais por questões de segurança.
Em toda África, os custos econômicos da discriminação aumentam de forma paralela à crescente pressão sobre empregadores, proprietários, fornecedores de atenção médica, instituições educativas e outros para que excluam as pessoas LGBT.
Hoje, o Banco Mundial e outras agências de desenvolvimento estão planificando as prioridades de desenvolvimento global que virão depois dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), que oficialmente terminam em 2015 e incluíam pontos específicos para promover a igualdade de gênero e fortalecer as mulheres como uma estratégia para lograr o crescimento econômico. Olhando para o futuro, o Banco deveria adotar o mesmo enfoque sobre os direitos das pessoas LGBT e fazer com que os países que queiram receber empréstimos deem proteção legal à orientação sexual e à identidade de gênero.
Gerar reconhecimento pelos direitos das mulheres nos ODM não corrompeu as culturas africanas impondo valores “ocidentais”. Na verdade, fortaleceu muitos países africanos, que agora são líderes mundiais do ponto de vista da representação de mulheres no governo. Se tentarmos aplicar uma proteção similar às pessoas LGBT, o investimento e a ajuda internacional podem melhorar o desempenho econômico e robustecer o respeito pelos direitos humanos básicos.
O Banco Mundial, sempre cauteloso em não se envolver em questões “políticas”, enfatiza que não é o encarregado de fazer cumprir os Direitos Humanos. Mas também reconhece, e cada vez mais, seu próprio papel como facilitador na hora de ajudar os membros do Banco a cumprir com suas obrigações na área. Os direitos dos LGBT deveriam ser um caso para estabelecer jurisprudência.
A ajuda aos governos que permitem que certos grupos sociais sejam excluídos pode implicar custos econômicos bastante reais. Na hora de considerar novos empréstimos deveriam ser tomadas medidas para assegurar que os benefícios sejam inclusivos no maior grau possível.
Se o Banco – que atualmente empresta à Nigéria quase 5,5 bilhões de dólares (mais de 12 bilhões de reais) e espera outorgar outros 2 bilhões de dólares em cada um dos próximos quatro anos – avançasse nesta direção, outras entidades de financiamento poderiam seguir seus passos. As pessoas LGBT da África precisam desesperadamente destes aliados poderosos em sua luta pelos Direitos Humanos e econômicos.
Adebisi Alimi (@bisialimi), defensor LGBT e ativista pelo HIG, fugiu para o Reino Unido após sofrer uma tentativa de assassinato na Nigéria. Aspen New Voices Fellow em 2014 o Aspen Institute.
Acesse o PDF: O custo da homofobia para o desenvolvimento