(Agência Patrícia Galvão, 05/12/2014) Envolver os homens no enfrentamento à violência contra as mulheres e promover a igualdade de gênero são desafios colocados pela campanha HeForShe, da ONU Mulheres, e relembrado há mais de duas décadas pela Campanha do Laço Branco. A mobilização internacional ocorre no dia 6 de dezembro e integra as ações dos 16 Dias de Ativismo pelo fim da violência contra as mulheres.
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No Brasil, as primeiras iniciativas da Campanha foram realizadas em 1999 pelo Instituto Papai, em Recife, e pelo Promundo, em Brasília. Responsável pela organização da Campanha do Laço Branco em São Paulo junto com a Ecos – Comunicação em Sexualidade, o filósofo Sérgio Barbosa explica que, além das atividades do dia 6 de dezembro, a Campanha desenvolve ações de conscientização em fábricas, empresas e instituições públicas, por meio de palestras, intervenções e ações preventivas que buscam mostrar como é possível resolver conflitos sem o uso da violência.
“O homem precisa, primeiramente, reconhecer a violência de gênero como um problema enraizado em nossa sociedade e como uma forma real de agressão, seja física ou moral, e a partir daí denunciar e mudar seus hábitos para evitar a propagação de uma cultura de violência”, completa o filósofo, que coordena o serviço de responsabilização para homens autores de violência do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde. Desenvolver ações nesse sentido nem sempre é fácil, pois os recursos disponíveis para as atividades são poucos. “Os órgãos públicos ainda investem muito pouco na Campanha em seu âmbito de ações preventivas de longo prazo”, lamenta.
Segundo Sérgio, a Campanha é voltada, em princípio, para homens não agressores e tem a intenção de incentivar esses homens a denunciar quando se depararem com uma situação de violência contra a mulher. “A Campanha é justamente para reforçar o lado positivo. Não é só para lembrar o massacre no Canadá, mas também para lembrar o que temos no Brasil: uma visão positiva de outros homens que não cometem violência contra a mulher e possam ser exemplos de uma sociedade mais equitativa, justa e honesta”.
Projeto promove educação de gênero para homens
No interior de São Paulo, no município de São José dos Campos, o projeto Mil Homens pela Paz foi criado em agosto, no aniversário da Lei Maria da Penha, com o intuito de envolver os homens no trabalho de conscientização sobre o tema. A diretora da Coordenadoria Especial de Políticas para Mulheres da Secretaria de Promoção da Cidadania da Prefeitura, Marcela de Andrade, lembra que, durante uma ação para mulheres em uma cooperativa de reciclagem, deparou-se com o questionamento de um grupo de homens sobre a ausência de ações específicas para o público masculino e decidiu desenvolver o trabalho.
“O objetivo do projeto é criar um ambiente para que os homens, não só os agressores, reflitam sobre essa realidade. Alguns ainda associam a violência apenas à agressão física ou não entendem o ciclo vivido pela mulher, que está envolvida emocionalmente com o agressor. Temos trabalhado isso e percebemos que conseguimos deixá-los bastante pensativos e reflexivos sobre o tema”, explica Marcela.
O projeto faz parte das ações da Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha e prevê um ciclo de dez palestras para sensibilizar mil homens para as questões de gênero. No decorrer das ações foi formado o Comitê Laço Branco, que conta com representantes da sociedade civil e tem o apoio e participação da Defensoria Pública de São José dos Campos para pensar na mobilização do dia 6 de dezembro e criar uma agenda de atividades para dar continuidade ao trabalho de conscientização e prevenção da violência contra as mulheres ao longo de 2015.
Segundo o defensor Júlio Camargo Azevedo, que atua na Vara de Violência Doméstica do município, o intuito do trabalho é retirar o estigma de que o enfrentamento deva ser feito apenas pelas mulheres. Para isso, a agenda prevê a realização de cursos sobre a cultura de gênero. “Sabemos que o preconceito e a discriminação vêm de uma construção cultural e para combater isso é preciso ter ações estratégias que contribuam para plantar uma semente de conscientização nos homens para a questão de gênero”.
Parlamentares mobilizam-se pelo fim da violência
O cartão vermelho é o símbolo adotado pela Frente Parlamentar de Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, uma iniciativa inédita criada em 2011 com o objetivo de promover a reflexão dos gaúchos e dar um basta à cultura de violência presente na sociedade.
Coordenada pelo deputado Edegar Pretto (PT-RS), a Frente conta com um grupo de trabalho composto por parlamentares e representantes da Defensoria Pública, Ministério Público, Tribunal de Justiça, universidades, Secretarias Estaduais e movimentos sociais, que se reúnem a cada dois meses para avaliar o trabalho desenvolvido e propor novas ações, como o Encontro Gaúcho de Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres, com a participação de atletas, artistas, ativistas e lideranças políticas. Em 2012, cerca de cem gaúchos cavalgaram pelas ruas de Porto Alegre para chamar atenção para a causa. Na 4ª edição do Encontro, neste 6 de dezembro, o trajeto será feito de bicicleta, da Praça Zumbi dos Palmares até o Gasômetro. Em parceria com a Federação Gaúcha de Futebol, a Frente também tem desenvolvido ações de conscientização nos estádios de futebol ao final dos campeonatos.
“Aqui no Rio Grande do Sul essa cultura machista é muito forte e não é à toa que ela existe. Ela vem dos ensinamentos de homens e mulheres de que o homem é o forte, de que não fica triste. Aos poucos estamos tentando mudar essa mentalidade. E há muita simpatia dos homens para essa luta”, ressalta o deputado.
Outro trabalho da Frente foi a organização do Relatório Lilás, publicado pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS em 2013, com estatísticas de diversas secretarias estaduais sobre a violência contra a mulher e reflexões sobre feminicídio, violência de gênero e Lei Maria da Penha. O intuito é atualizar os dados do documento anualmente para servir como fonte para a implementação de políticas públicas de enfrentamento ao problema.
As ações inspiraram a criação no Estado da Rede de Frentes Parlamentares pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Atualmente, 53 municípios gaúchos contam com Frentes Parlamentares que fazem o mesmo trabalho no âmbito municipal. Em nível nacional, neste ano foi criado o Movimento Nacional dos Parlamentares Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres, coordenado pelo deputado Edegar, com o intuito de criar Frentes por todo o Brasil. Até o momento, foi criada uma Frente em Santa Catarina e outros seis Estados manifestaram interesse pela ação.
Além da ampliação para todo o território nacional, o objetivo para 2015 é incluir o debate sobre a violência contra a mulher e a Lei Maria da Penha no currículo das escolas. “Tem que haver um momento em que os professores possam falar sobre esse assunto. Se nós não interviermos na educação das crianças, a menina que vê a mãe ser violentada em casa tem um grande possibilidade de ser uma mulher submissa e o guri que vê o pai batendo na mãe pode se tornar um homem agressivo”, afirma o deputado.
Como surgiu a Campanha do Laço Branco
A Campanha do Laço Branco surgiu no Canadá após o assassinato de mulheres que ficou mundialmente conhecido como o Massacre de Montreal. Em 6 de dezembro de 1989, um jovem armado invadiu uma sala de aula na Escola Politécnica de Montreal ordenando que todos os homens saíssem e ficassem apenas as mulheres; em seguida ele matou 14 mulheres e feriu outras 14 e logo depois se matou. No bilhete encontrado no corpo do assassino ele explicava que queria “acabar com as feministas que destruíram sua vida”. Na carta havia ainda o nome de 19 mulheres feministas que ele pretendia matar.
O crime mobilizou a opinião pública canadense, gerando amplo debate sobre as desigualdades entre homens e mulheres e a violência gerada por esse desequilíbrio social. Foi assim que um grupo de homens lançou a Campanha do Laço Branco em 1991 com a intenção de mostrar que, apesar de existirem homens violentos e agressores, existem também homens que repudiam tais atos de violência contra a mulher. Eles elegeram o laço branco como símbolo e adotaram como lema: jamais cometer um ato violento contra as mulheres e não fechar os olhos frente a essa violência.
Conheça a Campanha da ONU #HeForShe
Idealizada pela ONU Mulheres, a Campanha #HeForShe foi lançada este ano para estimular o engajamento de homens pela igualdade de gênero e fim da violência contra a mulher. Durante o lançamento da Campanha em Nova York, a atriz britânica Emma Watson, embaixadora da Boa Vontade da ONU Mulheres, defendeu que “é hora de começar a ver gênero como um espectro ao invés de dois conjuntos de ideais opostos”. Para o secretário geral da ONU, Ban Ki-moon, “violência contra a mulher é um problema global e deve ser combatido por homens e mulheres em conjunto”.
A Campanha já conta com quase 200 mil adesões em seu site, que disponibiliza um mapa atualizado em tempo real para monitorar a participação dos homens. No Brasil, o número de adesões chega a quase 4 mil. Durante a Copa do Mundo mais de 400 torcedores cederam suas imagens para divulgação da mensagem #HeForShe. Os apoios vieram de homens e meninos de 22 países.
Contatos:
Dep. Edegar Pretto – Coordenador da Frente Parlamentar dos Homens pelo Fim da violência contra as mulheres
E-mail: [email protected]
(51)3210-2450
Marcela de Andrade – Diretora da Coordenadoria Especial de Políticas para Mulheres da Secretaria de Promoção da Cidadania da Prefeitura de São José dos Campos
(12) 3932-8629
Sergio Barbosa – Coordenador da Campanha do Laço Branco em São Paulo pelo Coletivo feminista
E-mail: [email protected]
(11) 3812-8681