(Folha de S. Paulo, 01/07/2015) Estudo genético de parte da população do país mostra que ancestrais dos negros brasileiros vieram de regiões diferentes da África
Um dos mais completos estudos genéticos já feitos sobre os ancestrais dos brasileiros mostra que, apesar do predomínio do DNA europeu, até brancos do Sul e Sudeste carregam em seus genes pistas sobre o tráfico negreiro.
Foram estudados voluntários de Salvador (BA), Bambuí (MG) e Pelotas (RS). Mas, com 6.487 participantes e 30 genomas humanos totalmente “lidos”, a pesquisa conseguiu ter uma visão aprofundada dos genomas africanos, indígenas e europeus que se mesclaram para formar a atual população brasileira.
Coordenado por Eduardo Tarazona-Santos, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o estudo saiu na revista científica “PNAS”. Tanto na cidade gaúcha quanto na mineira, mais de três quartos do genoma dos moradores deriva de ancestrais europeus. Só em Salvador a situação é mais equilibrada, com 50,8% de contribuição genética africana e 42,9% europeia.
A desigualdade fica mais clara quando se olha apenas os genes passados pelo lado materno, como os do DNA mitocondrial, o legado das mulheres indígenas e negras é muito mais acentuado. Ou seja, homens europeus frequentemente se casavam com elas, mas mulheres europeias raramente tinham parceiros negros ou indígenas.
As análises de DNA mostram ainda que, apesar da mestiçagem, o que predominou ao longo dos séculos foram as uniões entre pessoas com ancestralidade parecida. “O Brasil nunca teve segregação como os EUA, mas nem por isso a mistura foi totalmente harmônica aqui”, resume Tarazona-Santos.
Para ele, um dos resultados mais interessantes da análise é poder enxergar com clareza a diferença entre as pessoas de origem africana do Nordeste, de um lado, e as do Sul e do Sudeste, de outro. Desse ponto de vista, é quase como se Salvador fosse a capital do Alabama.
Isso porque, na metrópole baiana, cerca de 80% da contribuição genômica negra teria vindo da África Ocidental, proporção que é muito parecida com a vista entre negros dos Estados Unidos.
Por outro lado, as amostras mineira e gaúcha indicam que cerca de 40% dos genes africanos teriam sido legados por gente de Moçambique e áreas vizinhas da África Oriental, do outro lado do continente.
Reinaldo José Lopes
Acesse o PDF: DNA do brasileiro carrega pistas sobre o tráfico negreiro (Folha de S. Paulo, 01/07/2015)