(El País, 24/02/2016) Na Academia, 93% dos membros são brancos e 77% homens
A Academia tentou. Em sua sede, em Beverly Hills, anunciando a nova leva de candidatos neste ano, estavam os rostos mais variados de Hollywood: um hispânico como Guillermo del Toro, um asiático como Ang Lee, um branco como John Kasinski e uma negra como a presidente da organização, Cheryl Boone Isaacs. Além disso, um dos Oscars de honra deste ano será entregue ao cineasta Spike Lee, e o mestre de cerimônias será Chris Rock. Mas esse exercício calculado de diversidade em uma instituição em que 93% dos membros são brancos e 77% são homens caiu por terra quando a nova lista de candidatos se mostrou tão dominada por brancos como a do ano passado.
Todos os aspirantes à glória como atores são brancos e, nas demais categorias, há apenas algumas poucas pinceladas de outras cores. O que é pior: a únicas indicações de filmes marcados por questões raciais, como Straight Outta Compton ou Creed, foram para melhor roteiro original e melhor ator coadjuvante, respectivamente, todos brancos, nos dois casos.
A polêmica tem o seu próprio #OscarTooWhite [OscarMuitoBranco]. Mas também poderia ser #OscarTooMale [OscarMuitoMacho], porque, mais uma vez, as mulheres só estarão presentes pelo fato de contarem com as suas próprias categorias no campo da interpretação, pois nas outras 20 estão quase totalmente ausentes, embora formem metade do público nas salas de cinema.
Somente figurino, montagem, maquiagem e cabelo contam com uma participação equitativa de ambos os gêneros. Nunca houve indicação de uma mulher para melhor fotografia, e neste ano não será diferente. Emmanuel Lubezki vencerá novamente por seu trabalho em O Regresso, sobre um grupo de homens. Nem sequer um terço dos 24 produtores indicados na categoria de melhor filme são mulheres, e dos 42 filmes concorrentes, somente dois foram dirigidos por mulheres (Mustang e What Happened, Miss Simone?), nenhum deles indicados para o último prêmio da noite.
Mas o próprio Spike Lee, que logo anunciou que, em protesto, não comparecerá à premiação, reconheceu que “a Academia não é a verdadeira frente de batalha”. “Como disse Chris Rock há alguns anos anos, na indústria não há ninguém que se pareça com ele entre os que dão luz verde aos projetos. Essa é a parte mais importante desta conversa”, ressaltou George Clooney ao EL PAÍS apontando para a falta de diversidade não só racial, como também cultural e de gênero nos estúdios.
Segundo uma análise do centroAnnenberg da USC, 73,1% dos filmes produzidos em Hollywood são “brancos”, uma percentagem que não varia desde 2007. Isso explica o porquê de haver apenas 65 atores negros e 26 hispânicos entre os 1.663 candidatos ao Oscar em 88 anos de história, sem falar de outras minorias. A percentagem é muito menor entre os realizadores: dos 433 aspirantes ao longo da história, sete eram hispânicos (incluídas as três candidaturas de Alejandro González Iñárritu), seis asiáticos e três negros. Nunca um diretor negro ganhou o prêmio. No caso das mulheres, das quatro únicas candidatas em 88 anos, só Kathryn Bigelow foi premiada.
Não é a primeira vez que a Academia esbarra nesse problema. Um dos maiores protestos foi liderado pelo reverendo Jesse Jackson 20 anos atrás com a criação da chamada Coalizão Arco-íris que defendeu o boicote quando só um dos 166 indicados era negro. Duas décadas mais tarde, está em pauta uma nova chamada ao boicote com resultados similares. Apenas uma dúzia de manifestantes com cartazes expressou seu mal-estar durante o último almoço dos indicados. O mesmo se espera para 28 de fevereiro, quando a presença dos manifestantes ficará diluída entre aqueles espontâneos que todo ano cercam o tapete vermelho para pedir aos indicados que se arrependam de seus pecados ou lembrar que Jesus é a salvação.
O único resultado alcançado com a polêmica foi um ato de contrição da indústria. “A verdade é que todos devemos dar mais atenção”, admitiu Clooney recordando que em sua curta carreira como diretor nunca trabalhou com um negro como protagonista. O propósito de emenda da Academia terá de esperar até 2020, ano em que a organização cinematográfica espera ver os frutos de um plano que exclui os membros que estiverem há década sem trabalhar no cinema. O desejo é duplicar o número de mulheres e minorias raciais. Um plano que recebeu elogios diante do público, mas gerou um claro mal-estar entre a maioria não tão silenciosa da organização.
São muitos os que, anonimamente, expressaram a este jornal insatisfação com a decisão, anunciando até mesmo que, com o dinheiro pago ser membro, mais de 300 dólares anuais, seria melhor assinar a Netflix e evitar críticas. “O sistema de votação é que tem problemas, mas, em seu lugar, põem a culpa nos membros de mais idade”, disse Nancy Beiman, membro da Academia por mais de 20 anos, em uma carta aberta ainda sem resposta que escreveu à organização. Outros que também se queixaram da polêmica são, precisamente, de uma das minorias supostamente representadas no protesto. Trata-se da comunidade indígena, retratada com grande lealdade e de forma numerosa em O Regresso, contratando atores índios e sendo fiel a seu idioma, um esforço que passou despercebido em um mar de queixas raciais.
Rocío Ayuso
Acesse no site de origem: A falsa diversidade do Oscar (El País, 24/02/2016)