(G1, 02/03/2016) Magistrado marcou audiência para data próxima à da cesárea da advogada. ‘Gestação não é dotada de surpresa’, disse juiz; OAB repudiou posição dele.
Com um julgamento marcado em data próxima à da cesárea da segunda filha, uma advogada de Brasília se surpreendeu com a resposta dada pelo juiz que se recusou a alterar a data da audiência: além de dizer que gravidez “não é dotada de surpresa”, ele diz que, consciente de que a gestação prevê afastamento no futuro, ela deveria renunciar ao caso.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) repudiou a postura e aprovou um ato de desagravo público em favor da profissional. O G1 procurou o Tribunal de Justiça, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem.
A resposta foi dada em 18 de fevereiro, faltando um mês para a comemoração do dia da mulher e no ano eleito pela OAB como o das advogadas. A profissional, Alessandra Pereira dos Santos, conta que está grávida de nove meses de uma menina. A previsão era de que o parto acontecesse no dia 21 de março, enquanto o julgamento foi marcado para o dia 29. Ela defende uma mulher que é ré em um processo de reintegração de posse.
Alessandra solicitou em janeiro a mudança da data. O processo corre desde 2011 e há três anos é acompanhado pela advogada. A previsão é que a sentença seja dada na próxima audiência. “Se fosse conciliação ou algo simples, até pediria par algum colega ir no meu lugar, mas não é o caso. Se eu peço que outro advogado faça, ele não vai saber todo o andamento do processo que a gente vem montando ao longo dos anos, e o cliente pode ser prejudicado.”
A advogada tentou inclusive que a sessão fosse antecipada. Ela apresentou a documentação para o juiz, comprovando a marcação da cesárea. Alessandra repetiu o mesmo procedimento para outras audiências – ela tem mais de 200 clientes e conseguiu remarcação das sessões para todos os casos.
“Ele sugeriu que eu saísse do processo e contratasse outra pessoa. Seu cliente te contrata na confiança. Como digo ao meu cliente que não vou mais continuar no processo?”, questiona. “Fiquei muito chateada com tudo isso que aconteceu, porque ele não só desvalorizou a profissional como a mulher, o direito da maternidade, o direito de ser mãe. Toda mulher sonha em ter filhos e construir uma família. E não é por sonhar isso que ela tenha que parar sua vida. Vou fazer cesárea, estarei de resguardo. Não tenho como ir à audiência.”
O presidente da OAB-DF, Juliano Costa Couto,disse ser solidário à situação da advogada. Ele também afirmou acreditar ser necessário ter maior compreensão com mulheres grávidas, especialmente às vésperas do parto.
“Entendemos que, quando houve a menção de que ela renunciasse à causa à que ela havia sido confiada por um cliente, houve uma atentado ao exercício da advocacia, como se contratar uma mulher fosse um equívoco”, declarou.
Raquel Morais
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