(Repórter Diário, 05/07/2016) Passar por uma situação de abuso sexual pode acarretar diversos traumas às vítimas que, por vezes, se isolam e ficam com vergonha de falar sobre a violência sofrida. Grande parte das pessoas que sofrem a agressão não recebe apoio dos próprios familiares e amigos, que duvidam da veracidade dos fatos e/ou tratam o caso com frieza. Em entrevista ao RDtv, a psicóloga Flávia Roberta Eugênio, membra da Comissão Gestora do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, sub-sede Grande ABC, diz que o primeiro passo é o acolhimento da vítima. “Quando uma mulher diz que foi vítima de estupro, por exemplo, as pessoas também desqualificam essa denúncia dela. Então a gente sempre diz que o primeiro passo é o acolhimento, sem julgamento”.
A psicóloga alerta também para a importância da vítima ser orientada, ter acompanhamento psicossocial e orientação jurídica, quanto aos seus direitos como vítima, na busca por justiça. “Então ela vai precisar sim de um acompanhamento, de orientação e de proteção, porque essa pessoa que cometeu a violência às vezes pode estar ainda ameaçando, pode estar ainda tentando cometer novas violências. Então a pessoa precisa de proteção”, diz.
De acordo com a Secretaria de Segurança do Estado de São Paulo, no ABC uma mulher é estuprada por dia. Mas a psicóloga acredita que o número é muito maior, pois os dados não contam com os casos de mulheres que não denunciam por medo, vergonha ou por possuir algum vínculo afetivo com o agressor. “Em casos específicos, se a pessoa tem algum vínculo familiar com a pessoa que cometeu o abuso, ela pode ser protegida pela lei Maria da Penha. As pessoas não tem conhecimento, em geral, dos seus direitos, o que faz com que denunciem menos”.
Flávia acredita que mesmo estando longe de ser o ideal, há considerável aumento no número de denúncias. Para ela, isso se deve ao assunto ser mais debatido que antes, na mídia e até em novelas, filmes ou mesmo dentro da escola. “O acesso à informação faz com que as pessoas busquem mais, fazendo a denúncia. […] A lei (Maria da Penha) fez com que novos equipamentos da política pública, focado no atendimento a mulher, surgissem. Então isso faz com que as mulheres tenham um lugar para serem atendidas, então elas buscam mais por ter um lugar específico para isso”.
Às vezes a falta de apoio vem das próprias mulheres que acabam acusando a vítima de ser em parte responsável pelo abuso. “Nós mulheres somos socializadas em uma sociedade machista. Então a gente aprende esses valores, esses conceitos, então a gente reproduz também. […] Então, uma vez que ela (a vítima) é exposta, isso se potencializa, são esses inúmeros julgamentos que a culpam, que tornam a vítima da situação culpada, tentam sempre culpar alguém. É a cultura do estupro que faz isso. A naturalização que acaba culpando as mulheres”.
Pacto de silêncio
Se para um adulto denunciar o abuso sexual é difícil, imagine para uma criança que, às vezes, nem compreende que é vítima. Flávia afirma que as crianças dão sinais de que não estão bem: isolam-se, tornam-se agressivas, adoecem, apresentam distúrbios no sono, na alimentação e no aprendizado. A profissional diz que é comum, em casos de abuso contra crianças, a pessoa que comete a agressão envolver a criança em “um acordo”, em um “pacto de silêncio”. Para que criança se sinta confortável para falar sobre o ocorrido é necessária uma aproximação cautelosa e um estabelecimento de um vínculo de confiança.
Flávia ainda diz que quando as crianças contam o que aconteceu muitos pais não acreditam nelas. Pensam que as crianças estão inventando. Sobre os tipos de ameaças feitas às crianças, Flávia diz: “Os agressores chegam a dizer que vai acabar com a família, matar a mãe, que vai fazer isso, aquilo. Ou até ameaças mais próximas da realidade da criança do tipo: ‘Você não vai poder sair e jogar videogame. Não pode contar’, o que envolve a criança neste pacto de silêncio por meio da ameaça”. É necessário que a família, amigos, vizinhos e a comunidade escolar estejam próximos para perceber os sinais de uma criança que precisa de ajuda, segundo a psicóloga.
Leiriane T. Corrêa
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