(HuffPost Brasil, 10/08/2016) O menino Bernardo tem uma longa vida pela frente e ele já sabe o que quer: uma camisa de Marta, a nossa camisa 10.
Aos que não acompanhavam – pela idade ou por desinteresse -, não é de hoje que as meninas do futebol são o que são.
Que tal as medalhas de prata obtidas nos Jogos Olímpicos de 2004 realizados em Atenas e em 2008, em Pequim?
Marta foi cinco vezes a melhor do mundo, afinal.
Salta aos olhos do torcedor comum – e também daqueles mais apaixonados e cansados dos desmandos e falcatruas da CBF – o quanto as jogadoras brasileiras se entregam.
É muita luta, é muito suor, é muita bola dividida para pouca cera e simulações de quem se machucou, mas só está fingindo.
Sobra autenticidade às meninas. Da goleira Bárbara até a matadora Beatriz, o que não falta é pulmão e vontade de vencer.
Com tudo isso, o futebol feminino nunca engrenou por aqui.
Nem mesmo a Medida Provisória (MP) 671/2015, assinada pela presidente afastada, Dilma Rousseff, conseguiu fazer a coisa andar. Na MP, há uma expressa contrapartida para os clubes endividados que querem ter suas dívidas refinanciadas pelo governo federal.
A contrapartida? Investimento dos clubes de futebol nas categorias de base e no esporte praticado pelas mulheres em troca de terem seus débitos renegociados.
Na época, disse a então presidente:
“Eu assumi com a Marta e com todas as jogadoras o compromisso de apoiar o futebol feminino, para romper com a precariedade que reina atualmente. Promessa esta que espero estar cumprindo. Todos nós temos de nos esforçar na medida em que o futebol feminino está na agenda internacional e também deve estar na agenda nacional.”
Resultado: choradeira geral dos clubes.
Ou seja: os clubes de futebol masculino completamente afundados em dívidas reclamam que o futebol feminino não faz receita, não tem torcida. Os mesmos clubes que chegam a cobrar R$ 100 para um lugar de arquibancada descoberta e acabam com estádios vazios em jogos importantes e decisivos.
Vamos ao ponto: o país de Pelé é o país de Marta agora. Será que um produto bem pensado não passa a ser superavitário?
Como nunca antes, a procura por uniformes das meninas passa a valer de verdade.
Com o desempenho sonolento e abaixo de qualquer crítica, o futebol olímpico masculino perdeu os holofotes. As críticas da imprensa – sempre tão pronta a aliviar para Neymar – também deram um empurrãozinho.
O futebol, até aqui, é totalmente delas na Rio 2016.
Mas a eterna dificuldade dos atletas de buscar uma alternativa e um time que nunca parece estar pronto para a adversidade são outros ingredientes que só fizeram o futebol feminino ganhar status de amor nacional.
No final das contas, lá estão as meninas novamente fazendo bonito em campo, ainda que contra tudo e contra todos. Na base da resistência, da raça.
E são essas atletas quem dão aos nossos dirigentes e empresários uma nova chance de fazer o futebol feminino florescer.
É que já não faz nenhum sentido que tanta vontade de nossas atletas – e do público – sofra um novo boicote.
Pelo bem do futebol brasileiro, as donas das bola devem ser as mulheres. Até o pequeno Bernardo já entendeu como as coisas vão ser daqui para frente.
Acesse no site de origem: O Brasil não tem mais o direito de boicotar o futebol feminino, por Rafael Nardini (HuffPost Brasil, 10/08/2016)