Em 1782, a quéchua Bartolina Sisa foi esquartejada durante a rebelião anticolonial de Túpaj Katari, no Alto Peru. O assassinato da indígena, símbolo da resistência ao domínio espanhol, em um 5 de setembro, é relembrado há 33 anos, desde que o II Encontro de Organizações e Movimentos da América ocorrido em Tihuanacu, na Bolívia, instituiu o Dia Internacional da Mulher Indígena. Bartolina Sisa é um exemplo do protagonismo das mulheres entre os povos indígenas na América Latina, um papel que vem sendo apagado desde o domínio dos colonizadores e que juventude vem resgatando.
(Catarinas, 06/09/2016 – acesse no site de origem)
A invisibilidade das mulheres indígenas é mais um capítulo na distorção da história contada pelos homens brancos. “Antigamente, nossas lideranças conduziam grandes comunidades que faziam a mobilidade guarani no nosso extenso Território chamado Yvyrupa. Essas lideranças eram comandadas por Nhanderu (figura equivalente a Deus para as religiões cristãs) e assim repassavam as leis e as punições para os demais. Tudo era feito em forma de rituais. Depois do contato (com os colonizadores) nossa mobilidade foi aos poucos sendo restrita por causa das guerras políticas de fronteiras de estados e poder. Nesse período, os colonizadores enxergavam as mulheres apenas como objetos de reprodução. A mulher não tinha voz, somente obedecia ou era punida com muita violência e essas violências vinham de todas as formas”, conta a líder Kerexu Yxapyry.
Segundo ela, o povo indígena guarani divide as tarefas que garantem o sustento da tribo: as mulheres são responsáveis pelas sementes e pelo plantio, enquanto os homens preparam o solo. “É uma necessidade ter mulheres indígenas assumindo os espaços para nosso povo elas são responsáveis pela sustentabilidade da comunidade e das famílias. O papel da liderança mulher é fundamental para ter equilíbrio da nação indígena no Brasil” afirma.
Ela própria é uma das lideranças que vem abrindo espaço para as mulheres na cultura indígena. Até o início do ano, ocupava a função de cacica da terra guarani do Morro dos Cavalos, em Palhoça. “Principalmente as lideranças jovens vem assumindo compromisso com as questões das políticas indígenas e governamentais, ocupando esses espaços de luta”, conta. Atualmente, a Articulação Nacional dos Povos Indígenas (APIB) também é liderada por uma mulher: Sônia Guajajara, da Terra Indígena Araribóia, no Maranhão.
Os empecilhos que as mulheres indígenas em posições de destaque encontram têm origens semelhantes aos enfrentados pelas mulheres brancas. “Hoje temos que assumir o papel de líder para falar de igual para igual com os homens e governantes e isso incomoda todo mundo que é do sexo oposto. Assim como tivemos uma presidenta da república tirada do seu mandato por um bando de machistas sem nenhum respeito, também temos aqui homens que pensam de forma igual”, conta a líder.
No Dia Internacional da Mulher Indígena, Kerexu rende homenagens a outra liderança histórica: Tataxin; em português, Dona Aurora. “Foi uma grande liderança mulher que liderou uma nação Guarani desde a Argentina até o Espírito Santo e morou por um tempo aqui no Morro dos Cavalos na década dos anos 60”, conta.
Ana Claudia Araujo