(Folha de S.Paulo, 09/01/2017 – acesse no site de origem)
Uma das hipóteses é que existe uma “especialização do trabalho”, na qual é o marido quem cuida do dinheiro.
Mas, como mulheres solteiras também apresentam desvantagem, economistas sugerem outras causas.
Entre elas está o menor conhecimento sobre finanças, a menor inclusão bancária -as contas não ficam nos nomes delas- e a menor independência para ir até o banco -seja por restrições culturais, seja pela dupla jornada, que lhes retira tempo útil.
É uma relação de mão dupla, diz Leora Klapper, economista-chefe da equipe de pesquisa em finanças e setor privado do Banco Mundial.
Quando a conta está no seu nome, você precisa entender como as finanças funcionam, e isso traz mais resultado.
As mulheres também têm um relacionamento com o dinheiro baseado em “alta frequência e valores menores”, na definição de Klapper
Ou seja, fazem transações mais frequentes, com quantias menores, tanto na hora de pagar quanto na hora de guardar. Por isso, precisam de produtos adequados e tecnologia bancária móvel que permita transferir
quantias com facilidade e fazer pagamentos eletrônicos.
Nos dados do Banco Mundial, a diferença na porcentagem de brasileiros maiores de 15 anos que pouparam nos 12 meses anteriores à entrevista foi de 7 pontos: 28% dos homens, 25% das mulheres.
CHEFES DE FAMÍLIA
Outro estudo, feito com base na Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, indica que, mesmo quando as mulheres brasileiras são as chefes de família, há uma defasagem entre o que elas e os homens conseguem poupar.
Os pesquisadores do Ipea Marcos Antonio Coutinho da Silveira e Ajax Reynaldo Bello Moreira avaliaram dados das duas POFs mais recentes (2002/2003 e 2008/2009).
Eles consideram o resultado difícil de explicar, já que essas mulheres, em tese, precisam de “maior volume de poupança precaucionária, uma vez que enfrentam maior incerteza no mercado de trabalho e que a maioria delas não conta com o seguro potencial representado pela renda de um cônjuge”.
Segundo eles, a “ampla evidência empírica” de que as mulheres são mais avessas ao risco justifica um estudo mais aprofundado.
NO MUNDO
No levantamento do Banco Mundial, em 87% dos países a porcentagem de homens que pouparam superava a de mulheres.
O país com maior diferença era a Arábia Saudita: 52% a 36%. Argélia, Espanha e Itália ficam logo atrás.
No outro extremo ficaram o Iêmen (15% a 25%) e a Áustria (75% a 84%).
CONCEITOS BÁSICOS
As pesquisas globais mostram também que é maior a porcentagem de homens que dominam os conceitos básicos de finanças: juros compostos, efeito da inflação, custo-benefício e a relação entre risco e lucro.
Especialistas no tema, as pesquisadoras Annamaria Lusardi e Olivia S. Mitchell testaram os conhecimentos financeiros em vários países do mundo.
“A diferença entre sexos é persistente”, escrevem no trabalho “Educação financeira ao redor do mundo”: elas acertam menos questões e é maior a parcela feminina que diz não saber como resolver os problemas.
A vantagem masculina acontece tanto nas questões mais simples quanto nas mais complexas, e os resultados femininos são mais baixos até mesmo entre estudantes de escolas de elite muito seletivas.
Os resultados, confirmados por muitos estudos em diferentes momentos, levou vários pesquisadores a tentar entender a diferença.
“Esse debate, no entanto, está longe de ser concluído e exigirá pesquisas complementares”, afirmam as professoras.
Independentemente de gênero, as autoras mostraram que o conhecimento sobre finanças é baixo em todo o mundo, mesmo em países ricos ou nos quais o mercado financeiro é bem desenvolvido, e que a instrução nesse campo é determinante na previdência de todos os grupos etários.
O FIM E O MEIO
Elas ressaltam, porém, que educação financeira não é um fim em si mesmo, mas uma forma de permitir que as pessoas empreendam com sucesso, invistam em educação, avaliem riscos e ultrapassem obstáculos de emergência.
Professora do Warthon College (escola de negócios da Universidade da Pensilvânia), Mitchell chama a atenção para o fato de que, mesmo com incentivos fiscais para que as pessoas invistam em plano de previdência privada, uma parcela grande de pessoas acaba fora desse produto, por desconhecimento.
Em vários países, a solução tem sido promover planos de previdência obrigatórios, ligados a empresas ou a categorias profissionais.
Alguns economistas já discutem a necessidade de desligar os planos de previdência dos vínculos trabalhistas, já que o mercado de trabalho é cada vez mais flexível.
O Banco Mundial tem defendido que a segurança financeira dos idosos e o crescimento econômico aumentam quando o governo adota três pilares: 1) previdência pública de participação obrigatória, com o objetivo de reduzir a pobreza dos mais velhos; 2) um sistema privado de previdência de participação obrigatória e 3) poupança particular voluntária.
“O primeiro pilar garante redistribuição de renda, o segundo e o terceiro dão segurança, e os três se auto-seguram para os riscos da velhice”, escrevem Lusardi e Mitchell.
Por Ana Estela de Sousa Pinto