Ouvidor da corporação vê ‘altos índices de estresse’ e pede teste psicológico para agentes
O R7 noticiou há quase duas semanas que Estado de São Paulo registrou 395 boletins de ocorrência contra policiais militares por violência doméstica durante o ano de 2016. Isso indica que houve ao menos um caso de agressão de autoria de um PM por dia.
(R7, 23/03/2017 – acesse no site de origem)
A maioria dessas agressões foram praticadas por homens, de acordo com o levantamento — apenas 5 das 395 ocorrências tiveram mulheres como autoras (veja o quadro abaixo).
Porém, especialistas ouvidos pelo R7 afirmam que a subnotificação de casos como estes fazem com que os números registrados sejam menores do que realmente acontece todos os dias no Estado.
A advogada Yasmin Cascone, especialista em direito da mulher e membro da Rede Feminista de Juristas, analisou os números repassados pela SSP (Secretaria da Segurança Pública) ao R7 por meio da Lei de Acesso à Informação e afirma que “as pesquisas nos levam a crer que os casos são subnotificados pela própria estrutura da PM”.
Ela também ressalta a “ineficiência e ineficácia do Estado em atuar na segurança dessas mulheres”. Segundo ela, os casos são subnotificados porque as vítimas são mal-atendidas e têm medo do que possa vir a acontecer com elas. A advogada diz que existe “um receio verdadeiro em fazer a denúncia e não ser protegida até o fim”.
— Estamos falando do machismo em termos estruturais e estruturantes dentro da PM, que é muito pouco enfrentado pelo Estado e que atenta diretamente contra a vida de mulheres. Há uma certa proteção dos agressores, o que leva mulheres a subnotificar os casos de violência.
Para o integrante do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoal Humana) Ariel de Castro Alves, os números são “bastante preocupantes” e demonstram que policiais “despreparados e que também não recebem apoio e assistência psicológica da corporação, ao invés de combaterem crimes, muitos cometem crimes”. Isso, segundo ele, gera maior sensação de insegurança na sociedade.
— Mostra também que os casos envolvendo violências praticadas por policiais militares não se restringem às ocorrências nas quais eles estão atuando supostamente no enfrentamento à criminalidade.
Ele concorda que exista uma subnotificação dos casos de violência doméstica envolvendo as autoridades porque quem notifica esses casos são as próprias corporações policiais.
Segundo Goretti Bussolo, do Instituto Todas Marias, que realiza um trabalho de apoio às mulheres vítimas de abusos, casos de agressões e estupros em famílias de militares são comuns e a falta de punição é recorrente. Ela diz que muitos PMs têm amigos dentro da polícia civil, o que diminui as chances de eles serem punidos.
— Os superiores deles também minimizam. A polícia ri das mulheres que sofrem violência doméstica, quando acionada pelo 190. [Essa é uma] queixa recorrente das mulheres.
Enfrentamento
A advogada acredita que, para que a situação mude, é preciso ser feito um enfrentamento dessa violência por parte do governo do Estado por meio de informações e ações educativas para os policiais.
— O problema precisa ser atacado na raiz. Especialmente porque, muitas vezes, são esses policiais que são chamados para primeiro socorrer diversas mulheres em situação de violência.
O integrante do Condepe diz que é preciso aprimorar os critérios de recrutamento e também melhorar a capacitação e formação dos policiais. Segundo ele, existe uma necessidade de apoio e acompanhamento psicológico permanente de PMs.
O ouvidor da polícia do Estado de São Paulo Julio Cesar Fernandes Neves afirma que os números mostram “a necessidade de todo agente policial passar por uma avaliação psicológica anual, principalmente aqueles que estão na rua”.
— Reivindicamos que todo ano eles passem por um psicólogo para fazer uma avaliação. Eles têm altos índices de estresse e o reflexo disso são esses números. Quem está mais próximo, sofre.
Giorgia Cavicchioli, do R7