Evento em São Paulo discutiu o papel da mídia no combate à cultura de agressão
Embora a cobertura sobre o tema tenha se ampliado na mídia brasileira nos últimos anos, as reportagens que tratam de feminicídio e violência contra a mulher ainda são superficiais e precisam ser melhor contextualizadas. A conclusão é de um estudo do Instituto Patrícia Galvão — Mídia e Direitos, responsável pela produção de conteúdo e estatísticas sobre os direitos das mulheres.
(Zero Hora, 29/05/2017 – Acesse no site de origem)
Durante cinco meses, o instituto monitorou a produção de reportagens sobre violência contra mulheres no Brasil. Pelo menos 71 veículos de imprensa foram pesquisados entre outubro de 2015 e março de 2016. O resultado foi apresentado para representantes da imprensa, do poder público, de redes de proteção e de entidades especializadas no workshop “Feminicídio: o papel da imprensa na cobertura do assassinato de mulheres no Brasil”, nesta segunda-feira, em São Paulo.
Uma das conclusões da pesquisa é que o termo feminicídio — qualificadora incluída no crime de homicídio – ainda precisa ser entendido e difundido pelos veículos de comunicação e pelos profissionais de Segurança Pública. Apesar de o senso comum tratar a morte de mulheres no contexto familiar de forma romantizada como “crime passional”, o debate trouxe à tona o esclarecimento de que o feminicídio não é um crime cometido por amor, mas, sim, por ódio.
Além disso, a pesquisa feita pelo Instituto revela que a cobertura jornalista sem critérios pode contribuir para naturalizar a violência, em vez de impedir a culpabilização da vítima e justificar a ação do agressor.
— Sempre que os veículos de comunicação puderem ressaltar qual é o verdadeiro motivo da morte e resgatar o histórico de violência que ela sofreu, as mulheres que estão consumindo esse conteúdo em casa poderão perceber que o feminicídio não é um fato isolado, que acontece em uma escalada de violência e que é preciso buscar ajuda — contribuiu a promotora de Justiça e coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica do Ministério Público de São Paulo, Silvia Chakian.
Entre os dados, a pesquisa revelou que 98% das reportagens reproduziram o fato isolado sem contextualizá-lo, apenas 1,3% das matérias apresentaram abordagens aprofundadas e 0,7% das publicações foram opinativas.
Apesar das falhas na cobertura do tema, os dados ajudaram a identificar o perfil das vítimas que chegam às páginas dos jornais. Na maior parte dos casos, elas já haviam buscado ajuda antes do crime e foram mortas por ex ou atuais companheiros.
O objetivo do debate é mudar o conceito de naturalização da violência, capacitar os profissionais e provocar o avanço nas políticas públicas para o enfrentamento da violência não só contra mulheres, mas transgêneras e transexuais. Conforme explicou Tereza Cristina dos Santos, coordenadora da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário de SP, a legislação permite incluir a questão de gênero quando identifica a “condição” do sexo feminino, ou seja, toda aquela que se identifica e se reconhece como mulher.
Schirlei Alves
*A repórter viajou a convite do Instituto Patrícia Galvão — Mídia e Direitos