Pessoas em situação de refúgio devido às suas orientações sexuais e identidades de gênero enfrentam dificuldades e violência ao longo de suas vidas, tornando-as ainda mais vulneráveis tanto em seu país de origem como durante seu deslocamento em busca de segurança e proteção internacional.
(ONU Brasil, 29/06/2017 – acesse no site de origem)
Esta foi a síntese dos debates realizados na terça-feira (27), no lançamento da cartilha sobre proteção de pessoas refugiadas e solicitantes de refúgio LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, pessoas trans e intersex). Esta publicação conjunta da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), e do Escritório do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos (ACNUDH), no marco da campanha Livres & Iguais da ONU no Brasil.
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O evento de lançamento, realizado no Centro Cultural São Paulo, contou com a participação da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania da cidade de São Paulo, da Caritas Arquidiocesana de São Paulo, de organizações e movimentos sociais articulados sobre a temática, e abriu espaço também para um emocionante relato da refugiada moçambicana Lara, de 33 anos, que é homossexual e há quatro anos vive no Brasil.
“No meu país de origem, assim como acontece em outros tantos países africanos, cresci com a ideia de que tinha uma doença ou era possuída por algum espírito por causa da minha orientação sexual. Eu sou mulher, gosto de mulheres, e demorou muito tempo para perceber que isso não era uma anormalidade ou um absurdo”, disse.
Lara reforçou o que dizem muitas outras pessoas LGBTI, que sentem uma enorme pressão para constituir famílias tradicionais, com homem, mulher e filhos, indo contra aos seus próprios sentimentos. “Passei por situações muito difíceis no meu país e quando decidi vir para o Brasil eu estava no meu limite, por ser enxergada como alguém inferior, como um ninguém. Deixei para trás minha família, uma grande amiga LGBTI que foi assassinada e agora estou aqui no Brasil, onde me sinto protegida”.
O relato de Lara causou comoção em todos os presentes e evidenciou as dificuldades que tanto os órgãos municipais, como também as organizações da sociedade civil, enfrentam ao lidar com este tema tão íntimo e de pouca exposição pública.
A Secretária de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Eloisa Arruda, trouxe a necessidade de se compreender o tema para então buscar solucionar as dificuldades da população LGBTI de forma transversal, orientando as demais secretarias públicas sobre a relevância desse tema.
“O fato de uma pessoa solicitar refúgio por motivo de gênero ou de sua orientação sexual, já é em si algo muito grave. Como reflexo disso, acho que o mundo passa hoje por um retrocesso devido a um enrijecimento de algumas questões, em especial no que se refere à liberdade sexual.”
Segundo Diego Nardi, assistente de meios de vida do ACNUR, o esforço conjunto em publicar esta cartilha especificamente voltada para o contexto brasileiro significa um marco para a promoção do direito das pessoas refugiadas LGBTI.
“A publicação tem o objetivo de promover o acesso à informação para esse grupo de pessoas e sensibilizar comunidade de acolhida, buscando elucidar quem são essas pessoas, quais são as dificuldades e desafios que elas enfrentam, assim como mostrar quais são os caminhos para melhor as acolher e proteger”, afirmou.
Para a advogada da Caritas Arquidiocesana de São Paulo, Larissa Leite, poucas pessoas de fato relatam em seu cadastro de atendimento aos solicitantes de refúgio as questões de gênero e orientação sexual. De acordo com a Convenção de 1951 e seu Protocolo de 1967, “o pertencimento a um grupo social, no caso LGBTI, permite que qualquer pessoa perseguida por questões relacionadas a gênero e sexualidade possam solicitar refúgio para sua proteção mediante a um fundado temor de perseguição”, afirmou.
A coordenadora adjunta de políticas para imigrantes e refugiados da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Andrea Zamur, mostra que o tema de pessoas refugiadas LGBTI é complexo e requer atenção plena da Secretaria de Direitos Humanos, resultando num esforço diário para que se possa atingir resultados efetivos.
“Por parte da gestão pública, os principais desafios que encontramos está inicialmente na identificação desse público em termos de registro, já que muitas pessoas optam por não se abrir sobre esta questão. Outro ponto fundamental quando se fala de prefeitura é justamente como fazer uma abordagem sem exacerbar o preconceito, sendo, portanto, fundamental o treinamento e construção de conhecimentos para os servidores do município que atuam na ponta.”
Esta foi justamente a atividade que o evento de lançamento se propôs à tarde, quando foram realizadas oficinas em diferentes módulos para sensibilizar funcionários públicos, membros da sociedade civil atuante e a população em geral para melhor compreensão dos conceitos de orientação sexual e identidade de gênero, abordagens respeitosas em entrevistas e referências para o melhor encaminhamento dessas pessoas à rede de apoio.
O treinamento durou quatro horas e contou com a participação da Associação Palotina, Centro de Integração da Cidadania do Imigrante, Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes (CRAI), Grupo de Incentivo à Vida (GIV), Centro de Cidadania LGBTI, Secretaria de Direitos Humanos e da Caritas São Paulo.
Ao longo do evento, a campanha da ONU “Livres e Iguais” (United Nations Free & Equal) também anunciou o resultado do 1º Concurso de Arte de Cartões LGBTI, tendo como proposta a pergunta: “como seria o mundo se todxs fossem Livres e Iguais para ser quem são e amar quem quer que seja?”.
O vencedor do júri popular foi o Grupo Debandada, que obteve mais de 1.800 curtidas no Facebook da ONU Brasil. A comissão julgadora do concurso, entendendo a alta qualidade das artes produzidas na categoria Amadora, decidiu conceder menção honrosa às quatro artes que concorreram o júri popular e escolheram duas artes vencedoras da categoria profissional. Os trabalhos vencedores podem ser visualizados pelo link https://goo.gl/NmH6gy.