A escritora Clara Averbuck relatou no Facebook e em depoimento a uma revista o estupro sofrido por ela quando voltava para casa, partindo de um motorista de Uber (a empresa alega ter desligado o funcionário e estar prestando o apoio necessário). Clara optou por não registrar o caso oficialmente em uma delegacia, mas lançou, junto a outras mulheres, a campanha #meumotoristaabusador #meumotoristaassediador.
(Emais, 31/08/2017 – acesse no site de origem)
Através das hashtags, mulheres compartilham desde terça abusos cometidos por motoristas de táxi, empresas de transporte particular e até mesmo transporte público (também na terça, uma jovem foi abusada por um passageiro em um ônibus na Avenida Paulista). O resultado, como era de se esperar, é desolador.
Desolador porque escancara a generalização desta violência e como nós, mulheres, não estamos seguras em nenhum lugar. Podemos ser assediadas, abusadas e estupradas estando sóbrias ou bêbadas, a qualquer distância de casa, a qualquer hora do dia. E ser feminista e/ou ter consciência que a culpa não é sua não diminui seu risco nem por um segundo (se o fizesse, a solução seria fácil).
Desolador também por mais uma vez destacar a inércia coletiva dos homens frente a estes casos de abuso, quando não a violência. Embora existam suas exceções, e aqui destaco a postura do motorista do ônibus em que uma jovem foi abusada na terça feira, a reação mais comum é duvidar da vítima e colocar sua palavra à prova (o que é um ato de violência), sem esquecer das ofensas direcionadas à vítima em um momento de fragilidade (Clara é feminista, tatuada, estava bêbada, um combo dourado de pseudo motivos para a culpabilização da vítima). A respeito disso, não tenho muito a dizer exceto que HOMENS, FAÇAM ALGUMA COISA. Demonstrem apoio, mostrem que se importam, revejam suas ações no dia a dia. Seja parte da solução, e não do problema, porque esse já é frequente o suficiente.
Posto isso, voltemos à escandalosa presença de violência contra a mulher no Brasil, que não é de maneira nenhuma exclusiva do transporte, mas que não foge dele. Se nossa sociedade é machista, suas ramificações também o são – até que se prove o contrário. E é por isso que cresce o número de aplicativos de transporte exclusivos para mulheres, como o Femitáxi, Lady Driver e outros. É uma vergonha sem tamanho vivermos em uma sociedade que precisa destes aplicativos exclusivos para que as mulheres tenham uma mínima segurança para se locomover, mas é o que é possível fazer enquanto nada muda estruturalmente e enquanto ainda são pouco efetivas as respostas das empresas tradicionais a respeito do assunto.
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Das empresas de transporte, só sei de uma que realizou um levantamento específico para a questão do assédio (a 99), mas os relatos de abusos, estupros e assédios aparecem em todas elas, tendo como denominador comum o sentimento de abandono por parte da vítima. É preciso que estas companhias tomem real partido em relação a isso. Queremos compromisso com a dignidade das mulheres e não com a imagem da empresa.
Queremos que não existam novos casos de #meumotoristaabusador, que nenhuma mulher seja constrangida ou ameaçada por quem deveria justamente poupá-la em momentos de vulnerabilidade. Queremos circular sem precisarmos nos perguntar se a pessoa ao lado vai nos tratar como gente. Não é nenhum pedido cinco estrelas, é apenas o mínimo a que nunca tivemos direito.