O Código de Ética dos Jornalistas determina que é dever dos jornalistas combater quaisquer práticas de perseguição ou discriminação
(Correio Braziliense, 13/09/2017 – acesse no site de origem)
Coletivo de Mulheres Jornalistas – Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF
O jornal Correio Braziliense, veículo impresso de maior circulação na capital do país, publicou nessa segunda-feira (11/9), em sua edição impressa e também em seu site, um texto, na seção “Crônica da Cidade”, que causou perplexidade, indignação e revolta em jornalistas do Distrito Federal e também em diversos leitores.
Intitulado “A estagiária”, em sua versão impressa, e “O primeiro dia de trabalho de Melissinha”, na versão on-line, o texto, assinado pelo jornalista Guilherme Goulart, mesmo que em formato de crônica, é um explícito desrespeito às mulheres, de modo geral, e às jornalistas e estagiárias, em particular. A maneira em que trata o assédio como forma corriqueira escancara o machismo e o sexismo ainda tão presentes nas redações, além de potencializar a ideia encrustada no imaginário da nossa sociedade patriarcal da mulher como objeto e de disputa entre colegas no ambiente de trabalho.
A repercussão negativa fez com que o jornal retirasse o texto do ar, logo que os comentários em repúdio começaram a circular nas redes sociais. As reações foram proporcionais ao nível de desrespeito contido no texto, que certamente passou pelo crivo do responsável pela editoria de Cidades.
Na manhã desta terça-feira (12), o jornal e o jornalista publicaram um pedido de desculpas, reconhecendo o erro desproporcional e a nocividade do texto. No entanto, as retratações não retiram a gravidade do fato, que continua merecendo o nosso repúdio e reflexão.
O escárnio vem num momento em que crescem as denúncias de estupros e violência sexual contra as mulheres, muitas vezes divulgadas nas páginas do próprio jornal. O Correio Braziliense errou feio ao publicar um texto que naturaliza o desrespeito contra a mulher em seu ambiente de trabalho. E, pior, naturaliza a ideia de que estagiárias estão nas redações para serem assediadas pelos seus colegas, posicionados em situação de hierarquia.
É inacreditável, conforme escreveram diversos leitores e jornalistas, que o texto, sem qualquer relevância e interesse público, conforme preconizam as teorias do jornalismo, tenha passado pela chefia do setor em que fora publicado.
Por isso, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF e o Coletivo de Mulheres Jornalistas do DF repudiam o texto e pedem explicações à direção do jornal sobre a publicação do conteúdo, de responsabilidade não somente do jornalista, mas, sobretudo, do veículo. Além disso, se solidarizam com as jornalistas e estagiárias frontalmente atingidas e com todas as outras que já foram vítimas de assédio.
O SJPDF ressalta que uma das ações realizadas no último ano foram as cobranças e fiscalização para que as direções dos veículos respeitem os estagiários, muitas vezes explorados como substituição da força de trabalho de jornalista profissional.
Também vale destacar a pesquisa realizada em 2016 pelo Sindicato, mostrando que 77,9% das jornalistas já sofreram algum tipo de assédio moral por parte de colegas ou de chefes diretos. Um número maior ainda, 78,5%, já enfrentou algum tipo de atitude machista durante entrevistas.
O Código de Ética dos Jornalistas determina que é dever dos jornalistas combater quaisquer práticas de perseguição ou discriminação. Assim como manter relações de respeito e solidariedade no ambiente de trabalho.
O fato ocorrido ontem demonstra que ainda temos muito pelo que lutar e destaca a necessidade de intensificar a campanha contra o machismo e o assédio sexual nos locais de trabalho. Também nos faz reafirmar que esse tipo de jornalismo, sem qualquer consideração ética e diálogo com o interesse público, não é o modelo que defendemos. Exigimos, portanto, explicações do jornal Correio Braziliense.
» Coletivo de Mulheres Jornalistas