Jovem, negra e mãe solteira: a dramática situação de quem dá à luz na prisão

18 de setembro, 2017

A mulher que dá à luz na prisão é jovem, negra e mãe solteira. Inédito, o censo carcerário de mães presas feito pela Fundação Oswaldo Cruz e pelo Ministério da Saúde confirmou um perfil socioeconômico observável nas unidades prisionais femininas.

(CNJ, 18/09/2017 – acesse no site de origem)

A pesquisa revelou também o drama da experiência de estar grávida e parir em uma prisão brasileira. Uma em cada três mulheres foi algemada após ser internada para o parto, apurou a pesquisa. A situação das mulheres que estão grávidas ou que tiveram filhos no sistema prisional é acompanhada pela presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, a partir de informações dos presidentes de tribunais de Justiça.

Entre agosto de 2012 e janeiro de 2014, os pesquisadores responsáveis pelo estudo “Saúde materno-infantil nas prisões” visitaram 24 estados brasileiros. Ouviram pessoalmente 495 mulheres presas, no ambiente prisional. Apenas 241 presas que deram à luz na cadeia e que tinham filhos menores de um ano foram consideradas como amostra do estudo. Desse grupo, 67% tinham entre 20 e 29 anos. A maioria das mulheres era negra – 57% se declararam pardas e 13%, pretas – e mãe solteira (56% da amostra).

files/conteudo/imagem/2017/09/8cb08475349aa3e0510a1e39390abfa8.png

A vulnerabilidade social do grupo das mulheres presas, especialmente as mães que tiveram filhos na cadeia, também foi constatada pelo  fato de 30% delas chefiarem suas famílias – 23% delas tinham famílias chefiadas pelas próprias mães. Praticamente metade delas (48%) não tinha concluído o ensino fundamental, ou seja, uma em cada duas mulheres presas entrevistadas estudou sete anos ou menos.

Experiência violenta e precária 

De acordo com os resultados do estudo, a vulnerabilidade social delas foi agravada durante a experiência da parição. Embora a maioria delas (60%) tenha sido atendida em até meia hora após o início do trabalho de parto, apenas 10% das famílias das presas foram avisadas. Uma em cada três mulheres foi levada ao hospital em viatura policial. A estadia na maternidade também foi problemática, uma vez que 36% das mulheres ouvidas relataram que foram algemadas em algum momento da internação. Maus tratos ou violência – verbal e psicológica –  foram praticadas por profissionais da saúde em 16% dos casos e por agentes penitenciários em 14% dos relatos.

Algemadas 

Sete mulheres das 241 ouvidas (8% do total) alegaram ter sido algemadas enquanto davam à luz. Apenas 3% das mulheres entrevistadas tinham acompanhantes na sala de operação e as visitas pós-nascimento foram autorizadas em somente 11% dos casos. De acordo com os relatos colhidos durante a pesquisa, a intimidade das mulheres parturientes foi respeitada por 10,5% dos profissionais de saúde e por 11,3% dos agentes prisionais.

Antes do parto 

Para analisar a experiência pré-parto e o atendimento prestado às gestantes, foi considerada recomendação do Ministério da Saúde, segundo a qual o pré-natal adequado tem de ser iniciado antes da 16ª semana da gestação. A distribuição das consultas é trimestral: uma no primeiro trimestre, duas no segundo e três, no terceiro. Apenas 32% das mulheres ouvidas tiveram um atendimento pré-natal adequado. Nove em cada dez mulheres entrevistadas chegaram à prisão grávidas. Destas gravidezes, duas de cada três  foram indesejadas. De todas as mulheres grávidas, 19% não ficaram satisfeitas com a notícia da chegada de um filho.

Monitoramento 

Em reunião com os presidentes dos  tribunais da Justiça Estadual, realizada no gabinete do STF no início de agosto, a presidente do CNJ e do STF, ministra Cármen Lúcia, cobrou dos presidentes informações sobre o número de presas grávidas nos seus respectivos sistemas prisionais. Apenas cinco presidentes apresentaram dados: Amapá (nenhuma presa grávida na prisão), Goiás (12), Maranhão (seis), Minas Gerais (40) e Pará (quatro). A ministra deve cobrar respostas novamente na reunião de setembro.

Regras internacionais 

O conjunto normativo considerado pelos pesquisadores, as Regras das Nações Unidas,  sobre o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras, foi editado em português pelo CNJ em 2016 na publicação “As Regras de Bangkok”. 

Manuel Carlos Montenegro

Nossas Pesquisas de Opinião

Nossas Pesquisas de opinião

Ver todas
Veja mais pesquisas