Homens que matam companheira ainda recebem pensão benefícios previdenciários. AGU também quer ressarcimento à Previdência
(Correio Braziliense, 22/11/2017 – acesse no site de origem)
A Advocacia-Geral da União (AGU) vai pedir na Justiça que os benefícios previdenciários pagos a homens autores de agressões contra mulheres sejam suspensos. Atualmente, por conta da falta de acompanhamento dos processos, homens que matam suas companheiras ou provocam a invalidez recebem pensões por morte ou por incapacidade das vítimas. A AGU vai atuar em cada caso após processo criminal tramitado em julgado. Para isso, a entidade firmou uma parceria com o Ministério Público Federal (MPF) com o objetivo de ter acesso ao Cadastro Nacional de Violência Doméstica. A cada hora, 503 mulheres são vítimas de algum tipo de violência. Por ano esse número passa de 12 milhões, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O acordo foi assinado pela ministra Grace Mendonça, da AGU e pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, durante o Seminário Internacional Brasil-União Europeia no Enfrentamento da Violência Doméstica, que ocorre no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), em Brasília. O cadastro reúne informações sobre processos que se enquadram na Lei Maria da Penha. Grace Mendonça destacou que a AGU também vai pedir ressarcimento ao erário nesses casos. “Nós vamos atuar em cada caso, pedindo a suspensão da pensão por morte para maridos que mataram suas companheiras. Existem casos até mesmo de homens que agridem as mulheres provocando a invalidez e depois viram os responsáveis legais por elas, recebendo benefícios do INSS. Vamos pedir ainda que esses agressores devolvam aos Estado os valores que receberam e indenizem os cofres públicos de benefícios pagos aos filhos dessas vítimas”, afirma.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, cerca de um terço das mulheres brasileiras sofrem algum tipo de violência doméstica, seja física ou psicológica. 43% das vítimas do sexo feminino que sofreram algum tipo de violência em 2016 foram agredidas em casa. De acordo com o levantamento, 61% dessas delas conheciam os agressores.
Raquel Dodge defendeu que o Brasil deve avançar nas políticas de igualdade entre homens e mulheres. “Ao longo da história as mulheres tiveram que lutar por direitos no Brasil. Primeiro foi pelo direito de voto, por mais liberdade e agora se briga por igualdade com os homens. A violência doméstica é um problema no mundo todo. Por aqui temos muitos casos que se quer são reportados. Muitas mulheres não tem a coragem de acessar órgãos públicos, porque ela tem de voltar para casa e a violência redobrar”, disse.
A farmacêutica Maria da Penha, que dá nome a lei de combate a violência contra mulheres, esteve presente no evento. Ela destacou a importância da legislação no combate aos crimes cometidos contra mulheres e lembrou da sua trajetória para responsabilizar penalmente seu agressor. Em 1983 o ex-marido da ativista tentou matá-la duas vezes, a tiros e por choque elétrico. As agressões fizeram com que ela ficasse paraplégica. O agressor foi condenado a oito anos de cadeia, mas ficou preso por apenas dois anos e hoje está livre.
O seminário também contou com representantes da União Europeia. A intenção é que o Brasil e os países que compõem o bloco realizem parcerias para combater este tipo de crime. Representantes de Portugal, da Lituânia e da Itália apresentaram ações nestes países para combater este problema. O Ministério Público explicou como funciona a Lei Maria da Penha e a criação de delegacias especializadas no atendimento à mulher.
R$ 30 mil em pensão
Um homem recebeu cerca de R$ 30 mil em pensão por morte da mulher que ele mesmo matou, na cidade de Guaraciaba, em Santa Catarina. O crime ocorreu em 2007 e o benefício foi pago entre os anos de 2010 e 2014. Nadir Montanha foi condenado a 14 anos de cadeia por matar a esposa. Em 2016 a AGU entrou com um pedido para que os valores fossem devolvidos ao INSS.
A 1ª Vara Federal de Carazinho (RS) determinou que os valores fossem devolvidos ao Estado, com correções monetárias.O juiz da causa concordou que o homem causou dano ao INSS, já que sem o ato dele, o benefício não deveria ser pago. Cabe recurso da decisão.
Em 2016 o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou um pedido da advocacia para que outro autor de feminicídio devolvesse aos cofres públicos o que recebeu do INSS por conta da morte da esposa. Ele matou a companheira com 11 facadas e em seguida pediu e obteve acesso ao benefício. O criminoso recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas a corte não reconheceu a repercussão geral do assunto, sendo mantida a decisão do STJ.
Renato Souza