Crianças estão sujeitas a distúrbios de aprendizagem, doenças psiquiátricas e demência
(O Globo, 05/02/2018 – acesse no site de origem)
O vírus da zika pode causar danos significativos ao cérebro do feto, mesmo quando o tamanho da cabeça do bebê é normal, segundo um novo estudo realizado com animais liderado por pesquisadores da Universidade de Washington em Seattle.
O dano, que pode ser difícil de detectar mesmo com exames cerebrais sofisticados, também pode ocorrer em crianças infectadas durante a primeira infância e adolescência.
— Os critérios atuais que utilizam o tamanho da cabeça para diagnosticar lesões cerebrais relacionadas a zika não conseguem capturar danos cerebrais mais sutis, que podem levar a problemas significativos de aprendizagem e transtornos de saúde mental mais tarde na vida — explicou a professora de Obstetrícia Kristina Waldorf, autora principal do estudo, publicado esta segunda-feira na revista “Nature Medicine”.—- Estamos diagnosticando apenas a ponta do iceberg.
O Brasil registrou uma epidemia de infecção por vírus da zika em 2015. Desde então, houve um aumento no número de bebês nas Américas nascidos com cabeças pequenas devido ao dano cerebral ocorrido quando suas mães foram infectadas durante a gravidez.
O vírus da zika destrói células-tronco neurais, que produzem novas células cerebrais para o crescimento e desenvolvimento normal do cérebro. Muitas dessas crianças são diagnosticadas durante a gravidez por ultrassom ou no nascimento, porque elas têm cabeças marcadamente pequenas, uma condição chamada microcefalia. Mais recentemente, cientistas reconheceram que mesmo as crianças com tamanho de cabeça normal ao nascer podem ser diagnosticadas com lesões oculares graves ou microcefalia de início tardio, quando a cabeça não cresce normalmente após o nascimento.
No novo estudo, os pesquisadores procuraram mudanças sutis no cérebro de cinco fetos de macacos cujas mães foram infectadas com o vírus da zika na gravidez. A espécie foi escolhida por ser ideal para o desenvolvimento de vacinas e tratamentos que protegeriam os seres humanos do vírus.
À exceção de um caso, os pesquisadores não encontraram anormalidades fetais óbvias em exames semanais de ultrassonografia, uma técnica de imagem médica que é comumente usada durante a gravidez para avaliar a saúde dos fetos em desenvolvimento.
O cérebro dos fetos infectados, no entanto, cresceu mais lentamente do que o normal, mas permaneceu suficientemente grande para que seu tamanho menor não atendesse aos critérios para a microcefalia associada ao vírus da zika, estabelecidos pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA.
Sob esses critérios, a maioria das crianças (entre 91% e 96%) nascidas nos EUA cujas mães foram infectadas com zika durante a gravidez não são considerados microcefálicas. Como resultado, essas crianças podem não ser verificadas regularmente por lesões cerebrais relacionadas ao vírus.
As imagens de ressonância magnética registraram que certas áreas do cérebro não estavam crescendo tão rapidamente quanto outras. As regiões particularmente atingidas foram aquelas que geram novas células no órgão. Entre elas estão a zona subventricular na parede do ventrículo lateral, que contém o maior número de células-tronco neurais no cérebro, e outra estrutura que desempenha um papel fundamental no desenvolvimento da memória.
— O estudo mostra claramente que as células dentro dessas regiões cerebrais são altamente suscetíveis à infecção da zika — revela Michael Gale Jr, professor de Imunologia e coautor do estudo. — Demonstramos que as células-tronco neurais nesses locais, e em estágios específicos de desenvolvimento, são incapazes de suprimir a replicação do vírus.